O Departamento de Estado dos EUA removeu uma frase altamente simbólica de sua atualização rotineira sobre Taiwan. Suas declarações anteriores afirmavam: “Não apoiamos a independência de Taiwan.” Essa frase desapareceu em 13 de fevereiro de 2025.
Mas isso não é tudo. O novo governo de Donald Trump também declarou no mesmo dia que defendia uma resolução pacífica e sem coerção para a questão sino-taiwanesa e se opunha a mudanças unilaterais no status quo por qualquer um dos lados. Essas podem parecer pequenas mudanças nas posições anteriores dos EUA, mas estão enviando um grande sinal para a China.
Pequim está preocupada que as mudanças no comunicado do Departamento de Estado sugiram que o governo Trump pode estar adotando uma postura mais firme do que o esperado ao se preparar para defender ou apoiar a ilha de Taiwan.
A questão para a China é que ela vê Taiwan como uma província rebelde, que deve retornar à órbita de Pequim. Muitos taiwaneses a consideram um estado separado.
A China não descartou o uso da força para tornar Taiwan parte da república e, na última semana, enviou aviões de guerra para patrulhar o Estreito de Taiwan. A China reivindica o canal entre a ilha e o continente como seu, embora isso seja contestado pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar.
Pequim ficará preocupada com a possibilidade de que a nova formulação dos EUA sobre Taiwan signifique que os americanos são menos propensos a permanecer inertes caso a China invada a ilha. Mas o que também é interessante é o motivo pelo qual os EUA estão se aproximando de Taiwan, apesar das queixas de Trump sobre o fato de Taiwan ter “roubado” a indústria de semicondutores dos EUA.
O olhar de Trump para os negócios
Dado o enfoque transacional, ou “business-first” (negócios em primeiro lugar), de Trump na política, não é surpreendente que a declaração atualizada de Washington sobre o apoio à independência de Taiwan possa estar mais voltada para reforçar os interesses dos EUA do que os de Taiwan.
Muitos membros do segundo gabinete de Trump, como o Secretário de Estado Marco Rubio e o Conselheiro de Segurança Nacional Mike Waltz, são críticos da China e a veem como uma ameaça à segurança nacional, defendendo uma postura mais agressiva contra Pequim. Uma das principais preocupações dos EUA é a crescente influência da China na Ásia, o que desafia a hegemonia americana na região.
Embora Washington ainda pareça acenar para a política de “Uma Só China“, sua nova declaração sobre a independência taiwanesa sugere que os EUA podem adotar uma abordagem mais agressiva diante de qualquer movimento de Pequim. A vigilância dos EUA sobre o conflito China-Taiwan significa que Pequim terá que pensar bem antes de tomar qualquer medida para recuperar a ilha neste momento.
Uma Pequim enfraquecida?
O presidente da China, Xi Jinping, esperava conquistar corações e mentes ao redor do mundo por meio da Iniciativa do Cinturão e Rota, seu plano global de comércio para construir uma rede internacional de países recebendo investimentos chineses. No entanto, com a economia chinesa fragilizada por uma crise imobiliária iniciada em 2021, a estratégia de Xi de demonstrar sucesso econômico não está funcionando como esperado.
Outra maneira de Xi fortalecer sua reputação como líder seria reincorporar Taiwan à China. Desde que o Partido Comunista Chinês chegou ao poder em 1949, vários líderes chineses estabeleceram a reunificação com Taiwan como um objetivo de longo prazo. Se Xi conseguisse trazer Taiwan de volta à China, poderia ser celebrado internamente como um dos maiores líderes que o país já teve.
Se o plano de reunificação já era um grande desafio, a mudança na postura dos EUA em relação à independência de Taiwan e sua oposição aberta à coerção ou ao uso da força tornam essa tarefa ainda mais difícil para Pequim. Isso pode enfraquecer a imagem de Xi e minar ainda mais seu governo – e, claro, pode fazer parte da estratégia de Trump.
Preparado para a mesa de negociações
Os EUA e a China passaram anos em negociações comerciais antes que as tarifas americanas fossem impostas a Pequim durante o primeiro mandato de Trump, culminando no acordo da “fase um” em janeiro de 2020. Trump já anunciou um acréscimo de 10% nas tarifas sobre produtos chineses em seu primeiro mês de governo.
É plausível que essas declarações sobre Taiwan tenham como objetivo aumentar o poder de barganha de Washington na crescente guerra comercial entre China e EUA.
Em 2016, Trump acusou a China de “violar” os EUA com políticas comerciais desleais e impôs tarifas de até 25% sobre os produtos chineses. Durante sua campanha presidencial de 2024, Trump chegou a sugerir que as tarifas sobre os produtos chineses poderiam chegar a 60%.
Tarifas mais altas são uma péssima notícia para Pequim, já que a China depende fortemente das exportações para impulsionar seu crescimento econômico. Isso é especialmente verdade no caso dos produtos de alta tecnologia da chamada “nova tríade” – veículos elétricos, baterias de lítio e painéis solares – essenciais para a recuperação da economia chinesa.
No entanto, se Pequim for forçada a recuar em Taiwan, Xi poderá ter que se apoiar fortemente na economia para manter sua legitimidade política. Quando isso acontecer, Pequim poderá ser obrigada a oferecer concessões aos americanos, como a compra de mais produtos dos EUA e a revisão dos subsídios que favorecem as empresas chinesas em detrimento dos negócios americanos na China.
No geral, é provável que alguém na equipe de Trump tenha pensado em todas as implicações dessa mudança na postura sobre Taiwan e a veja como benéfica para a economia dos EUA – e, potencialmente, para o governo Trump como um todo. Taiwan é apenas um peão no jogo.
Texto traduzido do artigo Trump’s quiet change to US position on Taiwan is all about the economy, de Chee Meng Tan, publicado por The Conversation sob a licença Creative Commons Attribution 3.0. Leia o original em: The Conversation.