Dark Mode Light Mode
Índia, um País em Fumaças
A China na América do Sul: O Porto de Chancay e o Papel Perdido do Brasil
Bilateral con el presidente de China, Xi Jinping, en el Gran Palacio del Pueblo de Beijing Bilateral con el presidente de China, Xi Jinping, en el Gran Palacio del Pueblo de Beijing Bilateral con el presidente de China, Xi Jinping, en el Gran Palacio del Pueblo de Beijing Bilateral con el presidente de China, Xi Jinping, en el Gran Palacio del Pueblo de Beijing

A China na América do Sul: O Porto de Chancay e o Papel Perdido do Brasil

Foto: Presidencia Perú na Flickr

A inauguração do porto de Chancay, no Peru, simboliza um ponto de inflexão no papel da América do Sul nas dinâmicas econômicas e políticas internacionais. Com um investimento de US$ 3,5 bilhões liderado pela estatal chinesa Cosco Shipping, o projeto não apenas reforça a capacidade logística do Peru, mas também evidencia a estratégia chinesa de expandir sua influência global por meio de infraestrutura crítica. A iniciativa faz parte de um esforço maior da China para integrar economias emergentes às rotas comerciais que conectam o Oriente ao Ocidente, consolidando sua posição como um dos principais arquitetos da ordem econômica contemporânea.

A China tem se destacado como o maior investidor mundial em infraestrutura nos últimos anos. Desde o lançamento da Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI) em 2013, Pequim alocou mais de US$ 900 bilhões em projetos que abrangem mais de 150 países, segundo o Banco Mundial. Esses investimentos incluem portos estratégicos, como o de Gwadar, no Paquistão, e o Pireu, na Grécia, além de redes ferroviárias, rodovias e parques industriais na África e na Ásia. O objetivo é claro: reconfigurar o mapa do comércio internacional e aumentar a conectividade entre mercados, criando o que Xi Jinping chamou de “comunidade com um futuro compartilhado para a humanidade”.

Na América do Sul, a estratégia chinesa tem encontrado terreno fértil. O continente, tradicionalmente visto como uma extensão da esfera de influência dos Estados Unidos, está rapidamente se tornando um espaço de competição estratégica entre grandes potências. Países como o Peru, Chile e Argentina têm se beneficiado de bilhões de dólares em investimentos chineses em projetos que vão desde mineração até energia renovável. O porto de Chancay, por exemplo, é projetado para reduzir em 10 dias o tempo de transporte marítimo entre a Ásia e a América Latina, economizando até 20% nos custos logísticos, o que representa uma transformação significativa para as exportações da região.

Esses investimentos não são puramente econômicos; eles também carregam implicações geopolíticas. Ao financiar e operar infraestrutura crítica, como portos e ferrovias, a China consolida laços econômicos que muitas vezes se traduzem em maior influência política. De acordo com o think tank americano Council on Foreign Relations, empresas estatais chinesas possuem participações em cerca de 100 portos em 64 países, destacando o alcance de sua estratégia global. Na América Latina, isso coloca Pequim em uma posição vantajosa, permitindo-lhe moldar as regras do comércio regional e se contrapor à influência histórica dos Estados Unidos.

Neste contexto, a hesitação do Brasil em aderir formalmente à BRI não é apenas uma decisão econômica, mas também uma escolha estratégica com implicações regionais e internacionais. Enquanto a China avança na consolidação de sua presença na América do Sul, o Brasil, maior economia do continente, ainda debate os méritos e riscos de uma adesão. A falta de uma posição clara levanta questões sobre a capacidade do país de liderar uma integração regional que maximize os benefícios dos investimentos chineses, ao mesmo tempo em que preserva sua autonomia política e econômica.

Diante dessa conjuntura, o Brasil enfrenta o desafio de equilibrar seus interesses nacionais com a crescente influência chinesa, enquanto mantém uma política externa capaz de dialogar com múltiplos atores em um cenário internacional em rápida transformação.

América do Sul: Riqueza Natural e a Necessidade de Investimentos

A América do Sul, com sua abundância de recursos naturais e mercados emergentes, deveria estar no centro das transformações econômicas internacionais. No entanto, enquanto a China avança como o principal investidor em infraestrutura no continente, a região como um todo ainda enfrenta enormes desafios estruturais que a impedem de alcançar seu potencial pleno. O lançamento da Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI) em 2013 trouxe consigo uma oportunidade para reduzir o déficit de infraestrutura e promover a integração regional. Contudo, apenas alguns países, como Chile, Uruguai e Peru, têm conseguido atrair e se beneficiar significativamente dos investimentos chineses.

O porto de Chancay, no Peru, é o exemplo mais recente e emblemático desse movimento. Com um investimento de US$ 3,5 bilhões liderado pela estatal chinesa Cosco Shipping, o projeto tem o potencial de transformar a logística da região, conectando o Oceano Atlântico ao Pacífico e criando um novo corredor de comércio entre a América do Sul e a Ásia. Essa infraestrutura estratégica reduz em até 10 dias o tempo de transporte marítimo entre os dois continentes e economiza até 20% nos custos logísticos. Além disso, o porto tem capacidade para movimentar 24.000 contêineres, consolidando o Peru como um importante hub logístico para o comércio internacional.


Ver mapa ampliado

Apesar de tais avanços, a América do Sul como um todo ainda está ficando para trás em relação à Ásia e à África, que têm absorvido volumes ainda maiores de capital estrangeiro em infraestrutura. Dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) mostram que, em 2023, a China investiu US$ 13 bilhões na região, principalmente em projetos como ferrovias no Chile, parques solares na Argentina e o Corredor Bioceânico, que busca conectar Brasil e Peru. Embora significativos, esses investimentos ainda são insuficientes para atender às necessidades da região, que possui um déficit anual de investimento em infraestrutura estimado em US$ 150 bilhões, segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

A desigualdade na distribuição dos investimentos também é um fator preocupante. Enquanto países como Peru e Chile se destacam na captação de recursos, outras nações, incluindo Bolívia e Paraguai, permanecem à margem dos grandes projetos, enfraquecendo o potencial de integração regional. Além disso, a ausência de uma estratégia coordenada entre os países sul-americanos para negociar como bloco limita o poder de barganha da região e reduz os benefícios coletivos dos investimentos externos.

A necessidade de modernizar portos, ferrovias, rodovias e sistemas energéticos na América do Sul é urgente. Sem essa infraestrutura, a região continuará a depender de um modelo econômico centrado na exportação de commodities, sem valor agregado, perpetuando sua posição periférica nas cadeias produtivas internacionais. Projetos como o Corredor Bioceânico e o próprio porto de Chancay poderiam ser catalisadores de maior integração, mas dependem de uma visão regional coesa que vá além de interesses nacionais isolados.

A crescente presença chinesa na América do Sul é uma oportunidade, mas também um alerta. A dependência de capital externo, sem contrapartidas claras que favoreçam o desenvolvimento sustentável e a inclusão social, pode ampliar as disparidades entre os países da região e aprofundar a dependência econômica. Para que a América do Sul se torne um ator relevante no cenário internacional, é necessário um esforço conjunto para atrair investimentos de forma estratégica, equilibrando os interesses nacionais com uma visão de longo prazo para o desenvolvimento regional.

Estados Unidos: Reação e Estratégia na Região

A presença crescente da China na América do Sul tem gerado preocupações em Washington. Historicamente, os Estados Unidos consideram a região parte de sua esfera de influência, conforme declarado pela Doutrina Monroe. No entanto, a capacidade limitada dos EUA de competir com os investimentos chineses na infraestrutura regional tem revelado uma lacuna estratégica.

A resposta dos EUA tem se concentrado em iniciativas como a Parceria das Américas para a Prosperidade Econômica (APEP), anunciada em 2023, que busca fortalecer os laços econômicos com a região. Contudo, enquanto a BRI se traduz em projetos concretos, como portos e ferrovias, a abordagem americana ainda carece de investimentos significativos. Em termos de números, enquanto a China destinou US$ 65 bilhões à América Latina em empréstimos para infraestrutura entre 2005 e 2021, os EUA investiram apenas US$ 3 bilhões no mesmo período.

Além disso, a hesitação de países como o Brasil em formalizar parcerias com a China é vista como uma oportunidade para Washington reforçar sua presença na região. A visita do presidente Joe Biden ao Brasil em setembro de 2024 teve como um dos focos a assinatura de acordos bilaterais em energia limpa e tecnologia, uma tentativa de contrabalançar a crescente dependência econômica do Brasil em relação à China.

Brasil: Hesitação e Riscos Estratégicos

O Brasil, maior economia da América do Sul, encontra-se em uma posição delicada. Apesar de a China ser o principal parceiro comercial do país, responsável por 31,3% das exportações brasileiras em 2023, a adesão à BRI levanta preocupações em Brasília. O governo brasileiro teme que tal decisão possa limitar sua autonomia política e aumentar a dependência econômica de Pequim, sobretudo em um momento em que o Itamaraty busca diversificar parcerias internacionais.

O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), retomado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi apresentado como a prioridade brasileira para atrair investimentos em infraestrutura. Contudo, a falta de recursos internos para financiar o PAC aumenta a importância de parcerias externas. Em 2024, a China já manifestou interesse em projetos brasileiros, como a modernização de portos e ferrovias. No entanto, a adesão à BRI divide o governo: enquanto Dilma Rousseff, presidente do Banco dos BRICS, defende a integração, o Itamaraty e o Ministério da Fazenda preferem negociar caso a caso.

Um dos riscos da hesitação do Brasil é perder competitividade em relação a vizinhos como o Peru, que agora tem acesso privilegiado ao mercado asiático por meio do porto de Chancay. Além disso, a ausência de uma estratégia clara pode comprometer a capacidade do Brasil de se posicionar como líder regional em fóruns internacionais como os BRICS e o G20.

América do Sul e o Papel do Brasil no Cenário Internacional

A integração econômica da América do Sul depende de uma liderança capaz de articular projetos regionais e atrair investimentos sustentáveis. O Brasil, com sua dimensão continental e posição estratégica, tem potencial para desempenhar esse papel. No entanto, para isso, será necessário equilibrar interesses conflitantes: de um lado, fortalecer os laços com a China para modernizar sua infraestrutura; de outro, preservar relações com os Estados Unidos e outros parceiros.

A hesitação em aderir à BRI não deve ser interpretada como um afastamento do relacionamento com a China, mas como uma oportunidade para redefinir os termos de cooperação. Em vez de se limitar à exportação de commodities, o Brasil pode exigir maior transferência de tecnologia e investimentos em setores de alto valor agregado, como energia renovável e tecnologia da informação.

Além disso, o Brasil precisa liderar a integração regional para maximizar os benefícios de projetos como o porto de Chancay. O Corredor Bioceânico, que conecta o Brasil ao Pacífico, é um exemplo de como a coordenação regional pode potencializar a competitividade sul-americana. Essa abordagem é essencial para que a América do Sul seja protagonista, e não apenas espectadora, nas transformações econômicas e políticas internacionais.

A inauguração do porto de Chancay, no Peru, evidencia a crescente influência da China na América do Sul e levanta questões fundamentais sobre o papel da região no cenário internacional. Embora os investimentos chineses tragam oportunidades de modernização e crescimento econômico, também revelam desafios estruturais e políticos. A estratégia de Pequim combina financiamento generoso com um fortalecimento de sua presença política, mas frequentemente carece de mecanismos que garantam o desenvolvimento sustentável e o equilíbrio das relações entre os países receptores e a China. Essa dinâmica alimenta preocupações sobre dependência econômica, falta de transferência de tecnologia e impacto ambiental de projetos de grande escala.

Por outro lado, os Estados Unidos, historicamente influentes na região, têm falhado em oferecer uma alternativa sólida à iniciativa chinesa. O descompasso entre o discurso americano de cooperação e a falta de investimentos concretos deixa um vácuo que a China tem ocupado com agilidade. A pressão dos EUA sobre países como o Brasil para evitarem uma adesão à Iniciativa do Cinturão e Rota demonstra o caráter geopolítico dessa disputa, mas não resolve os problemas reais de infraestrutura e integração regional enfrentados pela América do Sul.

O Brasil, com sua dimensão continental e posição estratégica, deveria exercer um papel de liderança na definição do futuro da região. No entanto, anos de crises políticas e escândalos de corrupção enfraqueceram sua capacidade de articulação regional. Grandes projetos, como as obras da Odebrecht e Andrade Gutierrez, que simbolizaram o protagonismo brasileiro em infraestrutura regional, foram manchados por investigações de corrupção, deixando o país politicamente fragilizado e economicamente instável. Enquanto isso, a China se consolidou como a principal parceira comercial de grande parte dos países sul-americanos e uma provedora confiável de recursos para obras estratégicas, como o porto de Chancay, o trem bioceânico e o corredor ferroviário no Chile.

A hesitação do Brasil em aderir à Nova Rota da Seda reflete não apenas um dilema estratégico, mas também a perda de sua capacidade de liderança na região. Enquanto o Brasil debate os riscos de maior integração com a China, o Peru, Chile e outros países avançam em projetos que os conectam diretamente aos mercados asiáticos, reduzindo custos logísticos e ganhando competitividade no comércio internacional.

Para que o Brasil recupere sua influência regional, será necessário investir em uma política externa mais assertiva e coordenada. O país deve priorizar a reconstrução de sua imagem internacional, fortalecer parcerias com seus vizinhos e apresentar uma visão estratégica para o desenvolvimento regional que vá além da dependência de exportações de commodities. O Brasil não pode se limitar a ser um receptor de investimentos; precisa ser um articulador capaz de liderar a América do Sul em direção a uma integração que beneficie a região como um todo, equilibrando as oportunidades oferecidas pela China com os interesses estratégicos dos países sul-americanos.

Em última análise, o futuro da América do Sul depende de sua capacidade de agir como um bloco coeso e estratégico, em vez de permitir que potências externas definam os rumos da região. O Brasil tem as condições de liderar esse movimento, mas para isso precisará superar suas fragilidades internas e assumir a responsabilidade de moldar o destino da América do Sul em um cenário internacional cada vez mais competitivo.

Mantenha-se atualizado com as notícias mais importantes.

Ao pressionar o botão Inscrever-se, você confirma que leu e concorda com nossa Política de Privacidade e nossos Termos de Uso.
Add a comment Add a comment

Deixe um comentário

Previous Post
https://www.flickr.com/photos/97534175@N00/

Índia, um País em Fumaças