A recente reunião entre o presidente sul-africano Cyril Ramaphosa e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, evidenciou tensões significativas nas relações entre os dois países, com implicações profundas para o Continente Africano como um todo.

A abordagem de Trump, ao confrontar Ramaphosa com alegações infundadas de “genocídio branco” na África do Sul, reflete sem sombras de dúvidas uma estratégia nos moldes da política externa que prioriza narrativas domésticas e interesses eleitorais sobre a diplomacia. Essa jogada, baseada na suspensão da ajuda externa e oferecer asilo aos agricultores brancos sul-africanos, demonstra nuamente uma postura intervencionista do presidente Trump que acabará por gerar desafios à soberania dos Estados africanos, demonstrando igualmente pura ignorância com os contextos históricos e sociais complexos do continente.
Portanto, essa atitude não apenas mina os esforços de reconciliação pós-apartheid na África do Sul, mas também, se quisermos reconhecer, estabelece um precedente perigoso de ingerência externa baseada em desinformação, porque não há evidencias claras do referido Genocídio branco na África do Sul, e é irreal a informação que Trump passa ao afirmar que não há agricultores negros na África do Sul e que a atividade de agricultura só é praticada pelos brancos Sul-africanos.
Outrossim, a decisão de Trump de não participar da próxima cúpula do G20 na África do Sul e a ameaça de retirada dos EUA do grupo destacam uma tendência de isolamento que pode enfraquecer a posição da África em fóruns internacionais cruciais. A própria questão da suspensão da ajuda dos EUA à África do Sul poderá ter efeitos agressivos nos próximos anos, em especial nos programas vitais, como o combate ao HIV, e compromete iniciativas de desenvolvimento econômico e social.
Além disso, a retórica polarizadora de Trump pode desestabilizar alianças regionais e desencorajar investimentos estrangeiros, prejudicando os esforços de integração econômica e fortalecimento institucional no próprio continente. A resposta da África do Sul, ao buscar diversificar parcerias comerciais e reforçar laços com outras potências, como China e União Europeia, demonstra uma tentativa de mitigar os impactos negativos e preservar sua autonomia política e econômica.
Há aqui um relevante ponto de reflexão para os Estadistas africano no que toca as estratégias alinhadas a nova pauta da política externa trumpista. A observância cautelosa das ações dos EUA ao nível do continente faz-se necessária, antes que se sejam plantadas sementes de desinformação que desalentam os difíceis laços de unidade e integração que o continente tem buscado a séculos.
Juvenal Pelo Quicassa é um especialista em Relações Internacionais, acadêmico e pesquisador angolano, com uma sólida trajetória acadêmica e profissional. Formado pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Relações Internacionais, aprofundou seus estudos com um Mestrado em Relações Internacionais pela Universidad Europea del Atlántico (Espanha) e complementou sua qualificação com pós-graduações em Gestão Urbana e Serviços Públicos e Agregação Pedagógica para o Ensino Superior.
Actualmente, é docente universitário no Instituto Superior Politécnico Internacional de Angola (I.S.I.A.), onde leciona disciplinas como Geografia Política, Direitos Humanos e Integração Econômica Regional. Antes disso, actuou no Instituto Superior Politécnico de Kangonjo (I.S.K.A.), ministrando matérias voltadas à análise da política externa e integração regional.
Além da docência, Quicassa tem experiência no sector administrativo, tendo trabalhado como Assistente de Direção na Trans Investiment Comércio Serviços e como Assistente Administrativo na Mucare Tec, onde desempenhou funções organizacionais e estratégicas. Sua actuação profissional também se estende à pesquisa acadêmica, sendo membro do Centro de Estudos e Pesquisas da UNIPIAGET (Benguela)
Como pesquisador, publicou diversos artigos científicos e análises sobre política externa, segurança internacional e integração regional, com destaque para temas como a política externa angolana, militarização do Estado e operações de paz das Nações Unidas. Além disso, é autor do livro "Sistema de Paz da União Africana face aos Conflitos em África: Desafios e Perspectivas para a Promoção da Paz e Segurança no Continente", consolidando sua contribuição para os estudos da paz e segurança no continente africano