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Sanções petrolíferas escurecem ainda mais o horizonte econômico da Venezuela Sanções petrolíferas escurecem ainda mais o horizonte econômico da Venezuela

Sanções petrolíferas escurecem ainda mais o horizonte econômico da Venezuela.

Foto por Wilfredor. Via Wikicommons. (CC0)

Em uma economia como a da Venezuela – pequena, aberta e profundamente debilitada por décadas de instabilidade política, econômica e social – os efeitos da reimposição de sanções petrolíferas e financeiras anunciadas pelo novo governo dos EUA terão um impacto profundo e duradouro.

Agora, somam-se a isso novas restrições ao comércio com países terceiros (chamados por Donald Trump de “tarifas secundárias“) e o retorno forçado de centenas de migrantes que dificilmente serão absorvidos pela economia interna.

Suspensão e queda

O setor petrolífero representa mais de 15% do PIB total da economia venezuelana e 80% das exportações totais. Com esses dados, é evidente que estamos diante de um choque negativo extraordinário que certamente perturbará o nível de atividade econômica interna e o já muito deteriorado nível de bem-estar social.

A suspensão das operações da Repsol, ENI e Chevron Corporation – para citar algumas das principais operadoras estrangeiras – fará a produção de hidrocarbonetos cair entre 20% e 30%. E as receitas externas associadas às exportações de petróleo, entre 35% e 38%.

No curto prazo, espera-se que – no melhor dos cenários – o PIB caia entre 2,5% e 3,5%, enquanto na última década o mercado interno da Venezuela já havia encolhido 70%.

Momento global desfavorável

O comportamento esperado da economia global também não será favorável. Confluem uma previsão de crescimento econômico moderado, a tendência de queda dos preços do petróleo, a maior oferta e competição no setor energético e o aprofundamento de políticas protecionistas. O agressivo aumento de tarifas anunciado pelo governo dos EUA se traduzirá em menores volumes de comércio internacional e maiores pressões inflacionárias globais.

Há ainda outros fatores importantes, como as forças que promovem a desglobalização e a desintegração dos fluxos comerciais (com efeitos muito negativos sobre as cadeias de suprimentos); as tensões geopolíticas associadas à guerra no Oriente Médio e na Ucrânia; e os crescentes problemas relacionados às mudanças climáticas.

Para a magnitude e natureza desses choques, não há capacidade interna que permita uma absorção ordenada e dissipadora dos impactos esperados.

Sem capacidade de reação

No âmbito da gestão fiscal, não há margem para compensar a queda na arrecadação por receitas petrolíferas. Há uma década, o governo não tem acesso aos mercados de capital estrangeiros nem à banca multilateral, e praticamente não existe um mercado financeiro interno.

Também não há espaço para ajustar os gastos públicos, que já se contraíram consideravelmente nos últimos anos (mais de 50% em termos do PIB). Menos agora que o governo decidiu indexar ao câmbio oficial os subsídios que concede e que representam quase 60% dos gastos da administração central.

As fortes restrições do Estado para reduzir seus gastos e o alto grau de dolarização da economia são fatores que enfraquecem a capacidade de um banco central já carente de independência para desenhar e implementar uma política monetária e cambial que possa ajudar na estabilização macroeconômica do país.

Colapso monetário

A partir de 2022, a suspensão parcial e temporária das sanções petrolíferas por meio da emissão (e reiteradas renovações) de licenças para empresas estrangeiras associadas à estatal PDVSA permitiu uma tímida recuperação da atividade econômica interna entre 2022 e o primeiro semestre de 2024.

Essa tendência começou a se reverter após as controvertidas eleições presidenciais de julho de 2024 e se aprofundou com o crescente deterioro das relações entre o governo venezuelano e a nova administração estadunidense.

Todos esses fatores evidenciaram a pouca sustentabilidade da política de “estabilização” aplicada pela autoridade monetária venezuelana (BCV), centrada no uso da taxa de câmbio oficial como principal âncora dos preços em moeda nacional.

De fato, já no primeiro trimestre deste ano, a taxa de câmbio oficial do dólar aumentou 34% e a taxa no mercado paralelo, 53%, com uma ampliação progressiva entre ambos os indicadores. Mas essa evolução ainda não reflete os efeitos da suspensão das licenças e da aplicação de tarifas punitivas aos países que comerciam com o petróleo venezuelano.

Inflação de três dígitos

Nesse cenário, além de se esperar uma contração da atividade econômica interna, parece inevitável que a crescente depreciação do bolívar venha acompanhada de uma importante aceleração da já elevada taxa de inflação venezuelana.

Muito provavelmente essa taxa voltará a se mover na casa dos três dígitos – há estimativas que a situam em torno de 200% em 2025 -, não apenas como consequência da depreciação cambial, mas também pela inevitável recorrência ao financiamento monetário de um déficit fiscal que poderia superar 15% do PIB.

Em uma economia onde os agentes sofrem há muito tempo com altas taxas de inflação, generalizaram-se os mecanismos de ajuste e reduziu-se ao mínimo a credibilidade na política econômica e nas instituições encarregadas de formulá-la e geri-la.

Desemprego e pobreza

A crescente informalidade do emprego e a incapacidade de desenvolver políticas sociais compensatórias representam um retrocesso na tímida redução dos níveis de pobreza registrada em 2023 e no primeiro semestre de 2024.

O retrocesso esperado no nível de vida médio dos venezuelanos só contribuirá para agravar o conflito político e social, o que certamente será respondido com maior repressão por parte do governo.

A economia e a sociedade venezuelanas exigem urgentes reformas estruturais que, por sua vez, requerem profundas mudanças institucionais. Mas essas mudanças não parecem possíveis sem restaurar a estabilidade política interna necessária para acordar uma agenda com o consenso que torne as reformas sustentáveis.

Infelizmente, hoje não parecem prevalecer as condições que permitam avançar nesse caminho.

Texto do artigo Las sanciones petroleras nublan el ya sombrío horizonte económico de Venezuela, de Luis Zambrano-Sequín publicado por The Conversation sob a licença Creative Commons Attribution 3.0. Leia o original em: The Conversation.

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