A primeira metade do século XX ficou marcada principalmente pelas Grandes Guerras, suas respectivas causas e consequências e pelo início de uma longa tensão geopolítica entre as então superpotências Estados Unidos e União Soviética. Em meio a esse período intenso e instável, é fundada, em 9 de setembro de 1948, a República Democrática da Coreia.
Considerada uma das nações mais isoladas do mundo, a Coreia do Norte é, desde sua fundação, controlada por um único partido político, com uma ideologia própria, o “Juche”, e limitada a governantes de uma única família. O contexto que antecede o ano de 1948 é caracterizado também por repressão dos coreanos e explica o caminho até a ascensão de Kim Il-sung, o primeiro líder do país.
Ocupação Japonesa e a Resistência Norte-Coreana
De 1910 a 1945, o Império Japonês foi responsável por ocupar oficialmente a península coreana a partir do forçado Tratado de Anexação Japão-Coreia. Ao longo desse intervalo histórico, os japoneses se apropriaram do território e o usaram a fim de impulsionar o crescimento econômico próprio. Medidas extremamente abusivas foram tomadas contra a população local, como trabalho forçado, exploração sexual das mulheres e deportações. Além disso, o Japão impunha elementos de sua cultura, como a aprendizagem da língua japonesa nas escolas e a adoção de nomes japoneses, e ainda forçava o recrutamento de coreanos para suas forças militares, especialmente durante a Segunda Guerra Mundial.
Influenciados pelo conceito da autodeterminação dos povos e por ideais nacionalistas, começaram a surgir movimentos pró-independência entre a população coreana. Em 1919, com a morte do Imperador Coreano Gojong por um suposto envenenamento pelos japoneses, uma série de manifestações contra o imperialismo japonês se mostrou presente no conhecido Movimento Primeiro de Março.
Durante a década de 1930, Kim Il-Sung, que futuramente se tornaria o primeiro líder do país, foi um dos combatentes a favor da libertação da Coreia. Ele passou sua infância na Manchúria (região chinesa, que também enfrentou a invasão japonesa nos anos 1931 e 1932) e chegou a ser treinado militarmente na União Soviética, onde juntou-se ao Partido Comunista.
Divisão das Coreias
Como parte do Eixo, ao lado da Alemanha Nazista e a Itália Fascista, o Japão foi derrotado na Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Algumas consequências haviam sido determinadas já no ano de 1943, durante a Conferência do Cairo, que contou com a presença dos líderes dos Estados Unidos (Franklin Roosevelt), Reino Unido (Winston Churchill) e da China (Chiang Kai-shek). Uma das decisões tomadas, portanto, foi a desocupação do território coreano.
Na Conferência de Yalta, entre os citados representantes dos EUA e do Reino Unido junto a Josef Stalin, foi acordada a participação intensa da URSS no combate das tropas japonesas. Em agosto de 1945, com a Conferência de Potsdam, foi dividido o território coreano, sem consultar a vontade dos locais. A partição foi determinada pelo Paralelo 38, que divide a península em áreas aproximadamente iguais, assim como, 40 anos antes, havia sido uma proposta considerada entre a URSS e o Japão. Nesse contexto, a parte norte ficou com a União Soviética e a sul com os Estados Unidos.
O Governo Provisório e o Apoio da URSS
As organizações nacionalistas norte-coreanas compartilhavam ideais semelhantes às do governo soviético. Assim, o estabelecimento da URSS foi notavelmente pacífico, sem a necessidade de controle militar. Os soviéticos deram abertura para a ascensão de grupos pró-independência comunistas, chegando a reconhecer administrações locais como o Conselho Comunista da Província South Hamgyŏng.
Com base na estrutura política soviética, em fevereiro de 1946, foi firmado pelos líderes norte-coreanos o governo do Comitê Popular da Coreia do Norte. Kim Il-sung, recém-chegado de seu treinamento na URSS, logo se tornou uma figura relevante e assumiu o posto de presidente desse governo provisório.
Entre os anos 1946 e 1947, reuniões organizadas por uma comissão entre os EUA e a URSS abordaram a questão da unificação das Coreias. Uma vez que não houve avanço, os Estados Unidos convocaram as Nações Unidas a fim de designar a retirada das tropas estrangeiras da península coreana, propor eleições livres e a criação de uma comissão da ONU para lidar com assuntos da Coreia. Essas propostas não foram aceitas pela União Soviética, que boicotou a votação, mas foram aplicadas na Coreia do Sul, onde, em 1948, foram realizadas eleições locais nos termos apresentados pelos Estados Unidos.
A Fundação
Em agosto de 1948 é feita uma nova assembleia popular, que em 3 de setembro do mesmo ano promulgou uma nova constituição, e finalmente, no dia 9 de setembro de 1948 é proclamada a independência, e consequentemente fundada a República Democrática da Coreia, popularmente conhecida como Coreia do Norte, sob o comando do então primeiro ministro Kim Il-Sung, tendo como capital Pyongyang (antiga capital das Coreias quando unificadas).
Com a proclamação no dia 9 de setembro, começaram as pressões para a legitimação dos governos (Coreia do Norte e Sul) sobre a nação coreana, havendo várias tensões e ataques entre os dois lados. Então, em 28 de julho de 1950 começa oficialmente a Guerra das Coreias com a invasão do Sul pelo Norte, Kim Il-Sung com o intuito de unificar as Coreias manda cerca de 75 mil soldados à capital da Coréia do Sul.
Apesar de nunca ter oficialmente terminado (os dois países não assinam o tratado de paz oficial), a guerra que em três anos chegou a matar quase 5 milhões de pessoas teve uma trégua em 1953, quando é assinado o armistício de Panmunjon finalizando o conflito armado, mas que continua com tensões.
A Imutabilidade do Estado Norte-Coreano
Atualmente, conhecido como o país mais fechado do mundo, tendo uma relação mais direta apenas com a China e Rússia, que foram suas apoiadoras na época do conflito. A República Democrática da Coreia é tem como líder supremo o neto de Kim Il-Sung, Kim Jong-Un (o comando do país sendo repassado de pai para filho), que comanda o país com um “punho de ferro”, país que hoje é altamente militarizado e uma das fontes de tensão na região, não apenas pelo problema com a Coreia do Sul, mas pela rixa com os Estados Unidos também.(LEE, 2000)
Pelo fato do seu exílio e difícil acesso, se tem pouca referência do seu funcionamento, as únicas informações tidas são dadas pelo próprio governo, por civis que fugiram do país ou da inteligência norte-americana. Sabe-se que o país comandado por Kim Jong-Un foi construído em cima de ideologias comunistas e uma ditadura super rígida com toque de recolher, um sistema de recompensas e “castas” político-sociais chamado Songbun, onde os mais fiéis ao governo são chamados para integrar a comunidade da capital, Pyongyang. (COLLINS, 2012) Sabe-se ainda que o país sofre com sérias inundações, causando problemas no seu abastecimento alimentar, levando sua população a insegurança alimentar grave.
O país atualmente segue a metodologia/filosofia Junche (palavra coreana para autossuficiência), onde temos a ideologia como alicerce para a sociedade, o endeusamento do líder, e uma mistura de corporativismo com neoconfucianismo. Andrade (2019) define da seguinte maneira: a Junche é “organizada como uma ideologia nacional que visa à autonomia do sujeito e da sociedade por meio da elevação dos potenciais do homem enquanto ser social, ‘dono e transformador’ do mundo. Esses potenciais são caracterizados, segundo a filosofia, por três características próprias do ser humano: a aspiração à independência, a capacidade criativa e a consciência”.
Durante o governo Trump, foi a primeira vez que houve qualquer tipo de aproximação entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte, mas desde a posse de Biden, novo presidente dos Estados Unidos, a relação entre os dois países e consequentemente com a Coreia do Sul voltou ao estado crítico inicial – com ameaças, treinamentos e demonstrações militares e testes de armas. A Coreia do Norte também é uma das causas das tensões entre China e Estados Unidos, sendo a China aliada norte-coreana e principal fornecedora do país.
Referências
ANDRADE, Carolline Acioli Oliveira. A Ideia Juche: uma análise acordética da filosofia política nacionalista norte-coreana. In: ANDRADE, Carolline Acioli Oliveira. O som do junche: a instrumentalização ideológica do k-pop da banda moranbong como ferramenta de legitimidade do regime norte-coreano do século xxi. São Cristovão: Universidade Federal de Sergipe, 2019. p. 68-80. Disponível em: https://ri.ufs.br/bitstream/riufs/12531/2/CAROLLINE_ACIOLI_OLIVEIRA_ANDRADE.pdf. Acesso em: 25 ago. 2021.
COLLINS, Robert. Marked for Life: songbun, north korea’s social classification system. Sl: The Committee For Human Rights In North Korea, 2012. 120 p.
DIVISION of Korea. Britannica, 2021. Disponível em <https://www.britannica.com/place/Korea/Division-of-Korea>. Acesso em 25 ago 2021.
LEE, Hy-Sang. North Korea: a strange socialist fortress. Westport: Praeger, 2000. 264 p.