Com o Término da Segunda Guerra Mundial e a derrota do Japão na Guerra, a Coreia país que antes era colônia japonesa, o território agora se divide em dois, sendo assim, a partir do paralelo 38º, e ao norte dele, fica situada a Coreia do Norte, que é uma zona de influência Soviética, e ao sul do paralelo se situa a Coreia do Sul, sendo uma zona de influência dos Estados Unidos. Com a bipolarização da Guerra Fria, esses dois territórios se veem separados política, ideológica e socialmente, mesmo que permanecesse a ideia de ser uma só Coreia, como antigamente, então, em função dessa divisão, as duas Coreias entram em guerra. Esse conflito teve a participação das tropas das Coreias, China, União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, Estados Unidos e da própria ONU. Ao final da guerra, se obteve um saldo de mortes de 160 mil estadunidenses, 400 mil sul-coreanos, 600 mil norte coreanos e entre 700 a 900 mil chineses (FELIPPE, 2019).
A Guerra das Coreias
Para entender o conflito é necessário observar que a Coreia é uma península que se encontra entre a China e o Japão, nesse contexto, já se percebe que os interesses dessas duas nações vão ser projetadas ao longo dos séculos no território das Coreias. Um segundo aspecto de bastante importância é o contexto histórico, que no momento era o de imperialismo europeu do século XVIII. Neste período a China e o Japão foram obrigados a fazer uma abertura comercial e política, e mais tarde este ato culminou no ataque do Japão ao Império Coreano de Joseon, logo, o imperador se viu forçado a assinar o Tratado de Ganghwa que tirou o domínio chinês sobre a Coreia e passou para o Japão, virando uma colônia japonesa. Contudo, devido ao ataque de outra nação ao território, o imperador Joneon, em 1897, promove uma série de reformas políticas na Coreia e muda seu nome para Coreia Imperial (FELIPPE, 2019).
O Japão, em 1902, em um jogo de poder na região, fez uma aliança com o Reino Unido, a qual culminou no reconhecimento dos interesses do Japão sobre a Coreia, em troca de reconhecimento dos interesses britânicos sobre a China, então, sentindo uma instabilidade na região, a Rússia movimenta tropas para a Coreia e entra em conflito com o Japão. Estes, para evitar uma guerra, propõem a divisão da Coreia em duas áreas de influência: ao Norte seria a área de influência Russa e ao Sul a área de influência japonesa (OBERDORFER; CARLIN, 2014 p. 4 apud de FELIPPE, 2019). Por fim, o Japão dominou a Península sul-coreana até a sua derrota na Segunda Guerra Mundial.
Durante o século XX houveram muitos conflitos, abusos e massacres nas Coreias e, em função disso,muitos dos documentos sobre esse período são sigilosos e, assim, a memória sobre esses fatos estão apenas nas lembranças e em algumas tapeçarias norte coreanas:
“No Sul uma década em particular – a de 1935 a 1945 – é um espaço em branco: milhões de pessoas usadas e abusadas pelos japoneses não conseguem acessos aos registros do que elas sabem ter acontecido com elas, e centenas de coreanos que trabalharam com os japoneses simplesmente apagaram essa parte da história como se ela nunca tivesse acontecido” (CUMINGS, 2005, p. 139 apud FELIPPE,2019).
Logo, como forma de resistência durante a Segunda Guerra Mundial, os coreanos se juntam com os Estados Unidos para lutarem contra os japoneses e em 1945, quando o Japão foi derrotado na guerra, a União Soviética e os Estados Unidos dividem, a partir do paralelo 38º, a península coreana, entendendo que a URSS ficou com a sua zona de influência ao norte, a qual já tinha sido demarcada anteriormente pelo tratado com o Japão, assim, os EUA assumem o Sul da Coreia, tendo em vista o vácuo de poder deixado pela derrota do Japão, Formando então a Coreia do Norte e a Coreia do Sul. Porém, essa divisão foi imposta e por isso gerou a insatisfação das sociedades Coreanas, entrando então em conflito para unificar novamente a península (FELIPPE, 2019).
Com a revolução comunista da China, a Coreia do Norte resolve promover uma experiência comunista no seu território, mas queriam expandir para a Coreia do Sul também, logo, promovem uma ofensiva contra seus vizinhos do sul, dando início a Guerra das Coreias, a qual ficou marcada como a primeira grande guerra durante o período da Guerra Fria. A Organização das Nações Unidas (ONU) foi acionada para a discussão do conflito no Conselho de Segurança , mas nessa reunião a URSS estava ausente, devido a um boicote à organização, com isso, os blocos capitalistas aprovam a Resolução 82 que determinava a situação da coreia como uma ruptura da paz e, mais tarde, a ONU envia seu próprio exército para a lutar do lado dos Estados Unidos mandando um conjunto de tropas com o propósito de retomar o domínio do Sul da península e avançar até parte do território Chines. Os exércitos dos EUA e ONU conseguem manter sua posição e avançam perto do território Chines. Sendo assim, o envolvimento na guerra se torna uma questão de segurança nacional e, por esse motivo, demanda que, em 1950, envie tropas para reforçar o exército norte coreano (FELIPPE, 2019 ).
Durante 3 anos a Guerra das Coreias se deu pelo avanço das tropas ora do sul ora do norte. A Guerra acabou apenas em julho de 1953, com a assinatura do Armistício em Panmunjon, que manteve a divisão das Coreias pelo paralelo de 38º e é mantida até os dias de hoje (FELIPPE, 2019 ).
O Massacre de Ganghwa
A partir do dia 6 de Janeiro de 1951 se iniciou um processo cruel e sangrento na história das Coreias, durou apenas três dias, mas para aqueles que sofreram, foi uma verdadeira eternidade. Se passou no condado de Ganghwa-gun, na cidade de Incheon, na Coreia do Sul, o local é composto por diversas pequenas ilhas que circulam a grande ilha de Ganghwa no lado oeste do país, diretamente na fronteira com a Coreia do Norte. No início da década de 1950 a Coreia do Sul estava passando por uma reforma agrária, e dentre todas as peculiaridades que esse processo trouxe ao país, a que mais marca esse contexto é a de que mesmo com o foco na industrialização, e na reforma agrária exatamente para apoiar esse princípio, os pequenos camponeses ainda eram apoiados, entendendo que seria difícil comportar tantos emprego em se tratando de um grande êxodo rural, contudo, o Estado ainda expropriava grande parte da renda desses camponeses.
Por muitos anos o Estado sul-coreano cobriu seus massacres, utilizando o pretexto da Guerra da Coreia para culpar seus vizinhos, e inimigos, por crimes hediondos, entretanto, as populações locais nunca desistiram de conseguir sua justiça. No início do ano de 2006, então, foram liberados documentos oficiais do governo sul-coreano, mais precisamente o documento chamado de Reporting Prosecutors Affairs, o qual pode ser traduzido livremente para “Reportando os Assuntos de Promotores”, e nesse documento constava o Massacre de Ganghwa, o qual consistiu na contagem oficial de 140 mortos, membros de famílias campesinas, executados pelo corpo de fuzileiros navais, na época uma instituição privada, assim como pela polícia e pelo exército sul-coreanos, essa liberação ocorreu porque desde a virada do milênio essas famílias fizeram diversos simpósios liberando o que sabiam sobre os massacres, causando um certo alvoroço e uma pressão no governo local. Nesse sentido, a motivação para esse ataque, descrita no documento, era o fato de que estas famílias estavam trabalhando por conta própria, sem os meios do governo, logo, no seu raciocínio naquele momento, foi determinado que precisavam de uma severa punição em função dessa desobediência.
Infelizmente, esse não foi o único massacre que ocorreu nessa época por parte de forças sul-coreanas contra seu próprio povo, e além disso, os Estados Unidos, que naquele momento eram os apoiadores desse país durante a guerra, não só estavam cientes da quantidade de mortes que ocorriam, como também as encobriram, culpando os comunistas do outro lado da fronteira coreana, o que se mostrava demasiado fácil em função da localização de Ganghwa, diretamente na fronteira. Além disso, os documentos comprovam que, além do conhecimento por parte dos dois governos, tanto da Coreia do Sul quanto dos Estados Unidos, sobre o grande número de mortes de civis, prisioneiros e refugiados, essas práticas também eram incentivadas em menor escala, mais precisamente, os documentos afirmam que eram incentivadas em menor escala mas não existia a fiscalização desses atos, qualquer motivo desenhado como uma forma de combate a indisciplinaridade e ao comunismo era aceito para a justificativa desses atos, pelo menos por parte dos tomadores de decisões naquela época.
Esses massacres ocorreram em paralelo com diversos outros, como o Massacre da Bodo League, de Ulsan, de Cheondo, de Yeosu e de Suncheon, assim como o assassinato de diversos prisioneiros norte-coreanos, ou qualquer outro grupo que fosse considerado um inimigo naquele momento; se somou, aproximadamente, 2.600 mortes de civis, e mais de 10.000 mortes de militares inimigos aprisionados, o que atualmente se reconhece como diversos atentados aos direitos humanos e como uma falta de responsabilidade de todos os envolvidos. A Coreia do Sul, então, desde 2008 reconheceu esses fatos de forma oficial e os trouxe à tona, desenvolvendo projetos de conscientização pensados para honrar aqueles civis assassinados, assim como criaram alguns eventos e pequenos monumentos, como uma forma de tentar prover para as famílias alguma forma de fechamento para esse ciclo tão doloroso.
Referências
FELIPPE, Fabricia. Repensando a guerra da coreia: o papel das grandes potências na criação e perpetuação do conflito na península coreana. Centro Universitário IBMEC, 2019. Disponível em: https://www.academia.edu/41391302/REPENSANDO_A_GUERRA_DA_COREIA_O_PAPEL_DAS_GRANDES_POT%C3%8ANCIAS_NA_CRIA%C3%87%C3%83O_E_PERPETUA%C3%87%C3%83O_DO_CONFLITO_NA_PEN%C3%8DNSULA_COREANA?bulkDownload=thisPaper-topRelated-sameAuthor-citingThis-citedByThis-secondOrderCitations&from=cover_page Acesso em 18 de novembro de 2021