Moçambique e Portugal possuem uma relação antiga. Se anteriormente o seu vínculo era de colonizador-colonizado, atualmente os dois países estabelecem relações bilaterais baseadas na cooperação nas várias esferas, incluindo a comercial. Todavia, apesar dos esforços atuais para a promoção e fortificação das suas trocas comerciais, verifica-se um enfraquecimento desta relação nos últimos anos. Assim sendo, o objetivo desta pesquisa é realizar uma análise bibliométrica e revisão sistemática das pesquisas científicas indexadas sobre o estado atual das suas relações comerciais nas principais bases de dados científicas. Esta pesquisa revela-se pertinente para verificar o estado de arte e o contributo das pesquisas científicas para o fortalecimento e promoção do comércio bilateral Moçambique-Portugal. Assim, foi feita uma busca nas bases de dados Scopus e Web of Science, a fim de reunir todos os documentos indexados para a análise bibliométrica e revisão sistemática. Os resultados demonstraram que as principais pesquisas científicas indexadas sobre a relação atual entre Moçambique e Portugal estão centradas nos objetivos de desenvolvimento sustentável, sendo os seus principais temas o alívio da pobreza, a sustentabilidade, dinâmica da conservação da biodiversidade, serviços de ecossistema, e não no fortalecimento das suas relações comercias.
Sumário
Introdução
Um dos principais fatores que influencia os indicadores macroeconómicos e a componente financeira de um país é o comércio internacional (Coelho et al., 2017). Parte fundamental da economia global durante séculos, o comércio internacional é uma prática sólida entre as nações devido ao avanço da tecnologia, da comunicação e das mudanças políticas e financeiras, visando o desenvolvimento das suas economias e a satisfação da demanda por bens e serviços por consumidores em todo o mundo (Gregório, 2023), resultando no estreitamento das relações entre os países.
Moçambique e Portugal possuem uma relação antiga. Tendo primeiramente sido uma colónia portuguesa, atualmente Portugal é um dos principais investidores moçambicanos e uma das suas fontes de importações (INE, 2022, citado em GEE, 2023). Para Portugal, Moçambique é um destino de importações e exportações de bens e serviços diversificados (AICEP, 2023). Apesar da crescente promoção do seu comércio bilateral, verifica-se um enfraquecimento das suas relações comerciais (AICEP, 2023). Assim sendo, no presente artigo realizou-se uma análise bibliométrica e revisão sistemática das pesquisas científicas indexadas nas bases de dados Scopus e Web of Science relativas às relações comerciais entre Moçambique e Portugal com o objetivo de analisar a evolução e o estado de arte das pesquisas científicas, assim como o seu contributo para o fortalecimento do seu comércio bilateral. O artigo é precedido pela revisão da literatura, seguido da metodologia, dos resultados, da discussão e da conclusão.
Revisão da literatura
O comércio internacional refere-se a troca de bens e serviços entre países sob regras instituídas por organismos internacionais e locais reconhecidos, a fim de regular a entrada e saída de bens, serviços, mão de obra e movimentação de capitais (Costa, 2022). Este fenómeno é também definido como o “intercâmbio entre produtos e serviços entre países, resultante das especializações na divisão internacional do trabalho e das vantagens comparativas dos países.’’ (Maluf, 2000, apud Coelho, 2017).
Moçambique e Portugal, para além de possuírem um passado colonial e histórico comum, atualmente mantêm relações nas várias esferas incluindo a comercial que é promovida pelos seus governos através de vários organismos, iniciativas, políticas e ratificação de acordos bilaterais para garantir uma atmosfera de negócios coesa (AICEP, 2023). Moçambique e Portugal são países distantes, mas ao mesmo tempo próximos (Vieira, 2022). Localizado no sul de África, Moçambique é um país independente, de língua oficial portuguesa, e com aproximadamente 33 milhões de habitantes. Rico em energia hidroelétrica, gás natural, carvão, minerais, madeira e produtos piscatórios, em 2022 Moçambique teve como principais exportações os combustíveis minerais, os metais comuns, os minerais e minérios, os produtos agrícolas e os produtos alimentares (AICEP, 2023). Portugal, por sua vez, é um país de língua oficial portuguesa, com 10, 28 milhões de habitantes, e tem como principais exportações minérios e metais, máquinas, químicos e borrachas, agroalimentares, material de transporte, peles, couros e têxteis, calçado e vestuário, madeira, cortiça e papel (Vieira, 2022).
Nos últimos anos, a relação comercial entre os dois países tem vindo a enfraquecer (Muchanga, 2024). De acordo com a AICEP (2023), em termos de balança comercial, em 2022, Moçambique foi o 36º cliente das exportações portuguesas, e o 66º das suas importações. Neste período, a balança comercial foi favorável à Portugal, tendo registado um excedente de 164 milhões de euros. Por sua vez, Portugal é o 6º mercado de importações da economia moçambicana. Os principais produtos exportados por Portugal e com destino à Moçambique são medicamentos, reagentes para diagnóstico e laboratório, trigo, centeio e materiais de construção (AICEP, 2023). Por outro lado, os principais produtos importados de Moçambique por Portugal são mariscos, seguidos da sacarose pura, madeira em bruto e o tabaco não manufaturado (INE, 2022, citado em GEE, 2023).
Figura 1– Balança Comercial de Bens & Serviços Portugal-Moçambique 1996-2022
Fonte: Gabinete de Estratégia e Estudos (GEE), a partir de dados de base estimados do Banco de Portugal
Face a este fenómeno, os seus governos em parceria com os seus agentes económicos têm vindo a definir e implementar estratégias conjuntas para a reversão do presente quadro (Lusa, 2024). Um dos exemplos atuais destes esforços é a assinatura de um novo protocolo de negócios em Abril de 2024 pela Associação Industrial Portuguesa (AIP) e a Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), cujo objetivo é fomentar e estabelecer alianças de modo urgente entre as empresas dos dois países, a fim de fortalecer a sua relação comercial (Sousa, 2024) Este interesse na solidificação das relações comerciais entre os dois países é importante não só para o aumento do volume das importações e exportações, mas também pela existência oportunidades de negócios atrativas para os ambas as nações (Lusa, 2024). Se por um lado Moçambique pretende contar com Portugal para aumentar a sua exportação de couro, desenvolver a sua indústria hoteleira e captar investimento para o seu setor energético (Mira, 2024), Portugal tem interesse em promover a internacionalização das suas firmas para o mercado moçambicano, que é um mercado alvo as suas proximidades linguística, cultural e histórica (Freixo, 2024)
Mediante o enfraquecimento das relações comerciais Moçambique-Portugal, apesar das tentativas do seu fortalecimento por ambos os países, o presente estudo pretende realizar uma análise bibliométrica e sistemática sobre o tema em apreço a fim de verificar a evolução das pesquisas científicas sobre este fenómeno de modo a trazer o contributo e análise da ciência para o fortalecimento deste comércio bilateral capaz e fortalecer as economias locais de ambos os países e de catapultar as suas oportunidades de negócios.
Metodologia
Para a presente pesquisa foi efetuada uma análise bibliométrica e revisão sistemática. A análise bibliométrica consiste na análise da comunicação escrita e científica de uma determinada área, da sua evolução, disseminação, autoria e aplicação dos resultados das pesquisas recorrendo a métodos estatísticos e matemáticos (Alvim & Costa, 2017; Moresi & Pinho, 2022). A revisão sistemática refere-se a análise do conteúdo do material científico recolhido e selecionado, a fim de verificar lacunas nas pesquisas existentes e sugerir pesquisas aprofundadas sobre o tema em questão (Busalim & Hussim, 2016, apud Moscardi et al., 2017). Através da presente metodologia, pretende-se responder ao objetivo do trabalho que compreende duas questões: Q1. Qual o foco das pesquisas que relacionam Moçambique e Portugal ao longo do tempo? Q2. Qual o contributo destas pesquisas científicas para o fortalecimento do comércio bilateral Moçambique-Portugal capaz de catapultar oportunidades de negócios para ambos os países e fortalecer as economias locais?
No dia 23 de agosto de 2023, conforme apresentado na Figura 2, foi realizada uma pesquisa online nas bases de dados Scopus e web of Science, devido a sua amplitude geográfica, cronológica e multidisciplinaridade dos documentos indexados, utilizando as palavras-chave “Trade and Mozambique* and Portugal*”, tendo obtido como resultados 13 e 42 artigos, respetivamente. Em seguida, todas as referências dos artigos foram exportadas para o formato Excel, compiladas em uma só planilha e filtradas com recurso ao bibliometrix. Desta filtragem foram encontrados 5 duplicados, obtendo 50 artigos.
Figura 2– Prisma
* A partir do software R Studio foram retirados os artigos que estavam duplicados em ambas as bases de dados, WSO e Scopus
**Artigos que a partir da leitura do título e do resumo não apresentaram similaridades com o tema da pesquisa.
Tal com referido anteriormente, após a recolha, junção e eliminação dos dados recolhidos na Scopus e Web of Science com recurso ao bibliometrix, foram apurados 50 artigos, dos quais foi feita a análise bibliométrica, sendo apenas 3 utilizados para a análise sistemática.
Resultados
Nesta seção são apresentados os resultados da análise bibliométrica e sistemática.
Análise Bibliométrica
A partir dos 50 artigos obtidos da Scopus e Web of Science, foram analisados vários parâmetros tais como os principais temas de pesquisa, os principais autores e países de produção científica, dentre outros, tal como veremos a seguir.
Evolução das publicações anuais dos documentos científicos em análise
A Figura 3 apresenta uma análise da quantidade de pesquisas científicas anuais indexadas e publicadas desde 2001 até 2023, resultantes da busca “Trade and Mozambique* and Portugal*” com o seu pico registado em 2019 com um total de 6 publicações. O baixo volume de pesquisas científicas publicadas aponta para um fraco contributo científico para o fortalecimento das relações comercias Moçambique-Portugal perante os seus esforços bilaterais para a sua recuperação (Sousa, 2024).
Figura 3– Produção anual científica
Fonte: software bibliometrix
Mapa temático
Na Figura 4 pode-se verificar que os temas centrais das pesquisas recolhidas são a pobreza, conservação da biodiversidade, serviços de ecossistemas, migração, tráfico dos escravos, dentre outros, e não interligados ao fortalecimento e desenvolvimento da relação comercial Moçambique-Portugal abordados nas questões centrais de pesquisa, Q1 e Q2, mediante o desequilíbrio na sua balança comercial (AICEP, 2023), e dos esforços crescentes de ambos os países para a reversão deste quadro (Sousa, 2024) .
Figura 4 – Principais temas de pesquisa
Fonte: software Bibliometrix
Autores com o maior número de publicações
A partir da Figura 5 pode-se apontar Rahman como o autor com o maior número de publicações, sendo as suas pesquisas focadas no desenvolvimento e saúde sustentável, seguido de Kim, Luz e Ryan, cujos estudos são centrados na sustentabilidade, gestão e conservação de ecossistemas. Assim, pode-se verificar que os autores com o maior número de publicações científicas indexadas resultantes da pesquisa “Trade and Mozambique* and Portugal*” não estão voltadas para a relação comercial Moçambique-Portugal, o que mais uma vez demonstra um fraco contributo científico para o desenvolvimento e fortalecimento deste comércio bilateral abordados nas questões centrais de pesquisa, Q1 e Q2.
Figura 5– Autores com o maior númerode publicações.
Fonte: software Bibliometrix
Autores mais citados
Dos autores mais citados, apresentados na Figura 6, temos Lozano com 269 citações, seguido por Murray com 192 e Pereira com 135.
Figura 6– Autores mais citados
Fonte: Bibliometrix
Lozano et al (2019) em “Measuring progress from 1990 to 2017 and projecting attainment to 2030 of the health-related Sustainable Development Goals for 195 countries and territories: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2017”, analisam os objetivos do desenvolvimento sustentável (ODS) relacionados com a saúde, medindo o progresso de 41 dos 52 dos indicadores de saúde global de 1990 até 2017. Os autores chegaram a conclusão de que o progresso da consecução destes ODS para 2030 dependem da implementação de uma ação política multissetorial orientada para a prevenção e investimento, o que muitos países estão longe de conseguir.
Murray et al (2018) em “Population and Fertility by Age and Sex for 195 Countries and Territories, 1950-2017: A Systematic Analysis for the Global Burden of Disease Study 2017” analisam as estimativas da população e da fecundidade utilizadas para acompanhar os progressos em vários indicadores internacionais de saúde e desenvolvimento por sexo, ano civil e idade com métodos padronizados e replicáveis. A partir da recolha de dados em 195 localidades baseados na equação do equilíbrio demográfico, os autores concluíram que de 2010 até 2017, houve um crescimento negativo na Europa central, ocidental e oriental, ao passo que foi registado um crescimento de 2% em 33 países da África subsaariana.
Pereira et al (2003), em “Differential slave trade to Europe and Brazil from the western and eastern African coasts as registered in the mtDNA pool”, analisam o efeito do tráfico de escravos na genética mitocondrial dos povos da América e da Europa. Através do estudo de uma população de 109 moçambicanos, a pesquisa chegou a conclusão de que existe uma maior correspondência entre os americanos e os moçambicanos, do que os moçambicanos e europeus.
O facto de os autores mais citados terem as suas pesquisas centradas nos ODS e não nas relações comerciais Moçambique-Portugal, revela um fraco contributo da ciência para o fortalecimento do seu comércio bilateral capaz de catapultar oportunidades de negócios para ambos os países de modo a desenvolver as economias locais (Sousa, 2024; Mira, 2024),
Principais países de produção científica
Como principais países de produção científica, a análise bibliométrica aponta para os EUA, Alasca, e o Irão, que são os países com as cores mais destacadas, como mostra a Figura 7. Tal como se pode verificar, Moçambique e Portugal não apresentam um volume de pesquisa substancial com relação ao seu relacionamento comercial e evolução ao longo dos anos, perante os seus esforços bilaterais para o fortalecimento da sua troca comercias.
Figura 7– Principais países de produção científica
Fonte: software Bibliometrix
Principais revistas de publicação
A Figura 8 demonstra as principais fontes de publicação das pesquisas em análise, com destaque para a revista Estudos Ibero-Americanos, a Journal of African History, a Lancet e a South African Historical Journal.
Figura 8– Principais revistas de publicação
Fonte: software Bibliometrix
Países com o maior número de citações
Na Figura 9, verifica-se que os Estados Unidos da América contemplam 461 citações, Portugal com 399 citações, o Reino Unido com 185 citações, a Suíça com 118 publicações e Moçambique com 85 publicações.
Figura 9– Países de produção científica o maior número de citações
Fonte: software Bibliometrix
Revisão sistemática
Tal como referido anteriormente, dos 50 artigos apurados após a filtragem com recurso ao Bibliometrix, a leitura e análise dos seus resumos, apenas 3 foram selecionados para a revisão sistemática por serem os únicos que, em parte, se relacionavam com as relações comerciais entre Moçambique Portugal.
Em “’Collective Memories of Portuguese Colonial Action in Africa: Representations of the Colonial Past among Mozambicans and Portuguese Youths”, Cabecinha & Feijó (2010), conduziram uma pesquisa empírica entre Moçambique e Portugal sobre as memórias coletivas do passado colonial através de perguntas abertas e fechadas dirigidas a jovens de ambos os países. Embora os participantes conheçam a história da colonização, o seu sentimento difere consoante a sua posição de ex-colonizador e ex-colonizado. Por exemplo, os portugueses classificam as Viagens de Descobrimento como positivas para a história de Portugal, ao passo que os moçambicanos olham para esta invasão e dominação colonial como negativa e de caráter exploratório. Os autores deste artigo citam Lourenço (1990) e Alexandre (1999) que apontam para uma visão hegemónica da parte portuguesa com relação as suas ex-colónias que prevalece na atualidade. Com este artigo os autores chegaram a conclusão de que o colonialismo prevalece até os dias de hoje nas mentes dos seus cidadãos, afetando a trajetória e a interação entre os dois grupos.
Trovão & Batóreu (2013) em “What’s New About Muslim Ismaili Transnationalism? Comparing Business Practices in British East Africa, Colonial Mozambique and Contemporary Angola”, analisaram o impacto das experiências coloniais nas culturas de negócio pós-coloniais através de uma pesquisa etnográfica que consistiu na comparação de práticas comerciais transnacionais dos Khoja Ismaili, muçulmanos estabelecidos nos territórios britânicos e portugueses da África Oriental e na Angola contemporânea. A pesquisa concluiu que embora a cultura de negócio dos Ismaili na atualidade não seja uma réplica da cultura colonial, existem muitas similaridades em aspetos tais como a importância do contato face a face, o empreendedorismo familiar, e a ênfase nos laços religiosos.
Carvalho (2018) em “Africa and Portugal’’ faz uma revisão bibliográfica da relação África e Portugal, dando enfoque a dimensão africana da política externa portuguesa no papel da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) como organismo que procura garantir a implementação da política económica e de desenvolvimento, atuando como o motor das suas relações. A evolução da política de cooperação portuguesa obedeceu 4 fases: 1976-1990, na qual o interesse em estabelecer a cooperação com as suas ex-colónias foi perdido; 1986, na qual a entrada de Portugal na União Europeia, obriga-o a redefinir e a retomar as suas relações de cooperação com as suas ex-colónias; a terceira fase representa a consolidação da cooperação com a criação do Instituto Português de Cooperação para o Desenvolvimento (IPAD); a quarta é marcada por uma recessão da fase anterior devido a um menor investimento na cooperação e na ajuda para o desenvolvimento, fator decorrente do reajuste económico em Portugal que implicou grandes cortes financeiros na despesa pública.
Com relação as perguntas Q1 e Q2 verifica-se que nenhum dos artigos respondem as perguntas sobre a sua relação comercial e desenvolvimento e fortalecimento da economia de Moçambique.
Discussão
Os dados referentes à balança comercial entre Moçambique-Portugal (Figura 1), mostram que a mesma é favorável para Portugal, e desfavorável para Moçambique, sendo exportados produtos acabados para Moçambique e matéria-prima para Portugal (Vieira, 2023). Este dado é essencial para a interpretação dos resultados da presente pesquisa bibliométrica e revisão sistemática. A Figura 1, referente a evolução das publicações anuais dos documentos científicos em análise, aponta para uma baixa existência de pesquisas científicas sobre a relação comercial Moçambique-Portugal ao longo dos últimos anos. Tal como demonstrado no mapa temático da análise bibliométrica (Figura 4) e pelo resumo dos artigos mais citados, as pesquisas resultantes da busca “Trade and Mozambique* and Portugal*’’ centram-se no alívio da pobreza, meios de subsistência, dinâmica da conservação da biodiversidade e serviços de ecossistemas, e nos indicadores de saúde para a implementação e monitoramento dos ODS. Este fato é igualmente confirmado pela revisão sistemática, na qual Carvalho (2018), demonstra a prioridade de Portugal em implementar os ODS nas suas ex-colónias por meio de organismos como a CPLP, visando o cumprimento das obrigações com a União Europeia. No seu estudo sobre as representações coloniais, Cabecinha & Feijó (2010) concluíram que a mentalidade colonial prevalece até hoje nos cidadãos moçambicanos e portugueses, existindo um sentimento de revolta por parte destes primeiros e de superioridade por parte dos segundos. Para além disso, o desequilíbrio na balança comercial entre os dois países revela uma fragilidade nas suas relações comerciais (AICEP, 2023), o que dá luz a interpretação do baixo número de pesquisas científicas indexadas sobre esta temática, tal como demonstrado pela análise bibliométrica e revisão sistemática. Todavia existe atualmente um esforço bilateral crescente para a fortificação e contributo para o desenvolvimento e aumento dos investimentos de ambos os países e dos seus agentes económicos, visando o aumento da robustez das suas relações comerciais (Vieira, 2022).
Conclusão e limitações
Com o presente trabalho foi possível responder as principais questões de pesquisa: Q1. Qual o foco das pesquisas que relacionam Moçambique e Portugal ao longo do tempo? Q2. Qual o contributo destas pesquisas científicas para o fortalecimento do comércio bilateral Moçambique-Portugal capaz de catapultar oportunidades de negócios para ambos os países e fortalecer as economias locais?. Relativamente a Q1. Verificou-se que os principais temas das pesquisas científicas até então realizadas relativas à relação entre Moçambique e Portugal centram-se no alívio da pobreza, sustentabilidade, dinâmica da conservação da biodiversidade e serviços de ecossistemas, ou seja, no cumprimento dos ODS, e não nas suas relações comerciais. Para a Q2., o facto de terem sido descartados 47 dos 50 artigos científicos encontrados na Scopus e Web of Science utilizando as palavras-chave “Trade AND Mozambique* AND Portugal*’’ para a revisão sistemática, para além de demonstrar a falta de pesquisas diretamente relacionadas com as relações comerciais entre os dois países, não permite obter uma visão científica e detalhada do estado das relações comerciais entre Moçambique e Portugal na atualidade. Este facto foi também constatado na revisão bibliométrica na qual os resultados apontaram para um fraco contributo da ciência para a resolução do enfraquecimento das relações Moçambique-Portugal perante os esforços de ambos os governos para o seu fortalecimento (Vieira, 2022; Mira, 2024; Sousa, 2024) , tal como demonstrado na revisão da literatura, Este facto, levanta a necessidade de pesquisas futuras para compreender o estado atual e a natureza desta relação entre os dois países. À luz dos dados da balança comercial e dos artigos da revisão sistemática pode-se ainda analisar futuramente os motivos e as soluções para a fragilidade desta relação e verificar se, tal como concluído por Cabecinha & Feijó (2010) e Carvalho (2018), o passado colonial, hoje presente nos sentimentos dos seus cidadãos, afeta ou não as suas relações comerciais, e se o fenómeno pode ser verificado para restante das ex-colónias portuguesas.
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