O Mercado Comum do Sul (Mercosul) iniciou suas atividades como organização intergovernamental em 26 de março de 1991, através do Tratado de Assunção, tendo como objetivo alcançar o Mercado Comum do Sul até 31 de dezembro de 1994, finalizando as duas fases do processo de integração: zona de livre comércio e união aduaneira, durante esse período de transição.
Um pouco depois do surgimento do Mercosul, ocorreu no Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, mais conhecida como Rio-92. Nesta conferência, os Estados participantes reconheceram a necessidade de adoção de medidas globais para a proteção ambiental. Para se alcançar esse desenvolvimento sustentável, dentro de um bloco de integração regional, deve haver um esforço de harmonizar as legislações ambientais de seus Estados Partes (OLIVEIRA e ESPÍNDOLA, 2015).
É inegável que os países que compõe o Mercosul possuem uma grande riqueza de recursos naturais, um dos principais fatores nada mais é que a presença da floresta amazônica nessa região, ultrapassando os limites transfronteiriços dos países que a integram. Além disso, a Argentina, o Brasil, o Paraguai e o Uruguai são países conhecidos por serem exportadores de produtos agrícolas e pecuários.
A proteção do meio ambiente e a busca pelo desenvolvimento sustentável atualmente são temáticas centrais nos debates internacionais. Tal fato se deve ao mau uso dos recursos naturais, os quais não ficam restritos às fronteiras de um país, podendo afetar outras nações. No Mercosul, o assunto está reduzido às discussões em subgrupo e de forma não integrada pelos Estados-membros, demonstrando a desatenção do bloco ao assunto (MORAES, MORAES e MATTOS, 2012).
Assim, deve-se buscar mecanismos que contribuam para uma legislação ambiental mais específica e unificada dentro do Mercosul, não só como forma de proteção do meio ambiente regional, mas também para mostrar no quadro internacional, o comprometimento do bloco com a proteção e defesa de seus recursos naturais, conhecidos mundialmente.
O objetivo central desse trabalho é evidenciar a importância de uma legislação ambiental unificada e concisa dentro do Mercosul, uma vez que seus países membros são detentores de recursos naturais e ecossistemas de suma importância tais como Amazônia, Patagônia e montanhas andinas.
Além disso, é imperativo a busca por uma agenda verde harmonizada entre os países do bloco. Para isso, é necessária uma breve análise sobre o ordenamento jurídico dos Estados-membros no que diz respeito ao meio ambiente e desenvolvimento. (MORAES; MORAES; MATTOS, 2012).
Ademais, esta pesquisa visa também uma breve analise do Acordo-Quadro Sobre Meio Ambiente no Mercosul e como este acordo influenciou no surgimento de uma política regional de meio ambiente dentro do bloco econômico.
Resultados e Discussão
Dentre os Estados-membros, o Brasil é o país que possui a legislação ambiental mais avançada, sendo norteada pelo art. 225 da Constituição Federal de 1988, em seu título VIII, capítulo VI:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:
I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV – exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade. (grifo nosso).
Juntamente com os preceitos constitucionais, o Brasil também possui uma vasta legislação complementar sobre o tema, com ênfase na lei nº 4771/65, a qual estabeleceu que as florestas no território nacional são bens de interesse comum a todos os habitantes do país. Além daquela, possui a lei nº 6938/81 que tornou obrigatório o licenciamento ambiental para atividades ou empreendimentos com potencial lesivo ao meio ambiente.
A Argentina possui em seu texto constitucional referências à proteção do meio ambiente em seu art 41¹. Contudo, há conflitos no ordenamento, uma vez que os estados possuem soberania para legislar sobre o assunto. Devido a isso, em 1993, aconteceu o Pacto Federal Ambiental com as províncias argentinas, no entanto, este documento não elenca normas uniformes vigentes em todo território nacional, sendo apenas um documento norteador de políticas públicas sobre o desenvolvimento ambiental (MORAES, MORAES e MATTOS, 2012).
Paraguai e Uruguai também possuem textos constitucionais consoantes à proteção ambiental, entretanto, não possuem uma legislação complementar mais detalhada e segura como a brasileira. Dessa forma, podemos perceber que cada Estado-membro integrou ao bloco suas questões inerentes à proteção ambiental presente em seus ordenamentos jurídicos próprios.
Importante lembrar que os textos referentes à proteção ambiental dentro do Mercosul começaram a dar seus primeiros passos logo após a Rio-92. Contudo, inicialmente resultou apenas em tratados e reuniões que visavam temas específicos envolvendo o meio ambiente e não a preocupação por estabelecer uma legislação ambiental unificada ao bloco. O documento de maior relevância nesse sentido é o Acordo-Quadro Sobre o Meio Ambiente (AQMAM), aprovado em 2001 e aditado em 2004 pelo Conselho do Mercado Comum (CMC), inaugurando a tutela ambiental regional.
Tal acordo prioriza a normatização do desenvolvimento sustentável e a proteção do meio ambiente, e por conseguinte, a qualidade desse desenvolvimento. Destarte, é estabelecido o princípio de desenvolvimento sustentável regional do Mercosul, que condicionará todas as tratativas do bloco, bem como é criado o Direito Ambiental do Mercosul, mediante a regulamentação da promoção da proteção ambiental e incentivo à coordenação de políticas setoriais (D’ISEP, 2017). Portanto, o AQMAM possui uma proteção ambiental integrada, com o papel de orientar o Mercosul como sujeito de direito internacional. Sendo assim, o presente acordo prioriza duas espécies de proteção: a autônoma, ao direcionar os rumos da cooperação para uma política ambiental comum; a integrada, que é reafirmada no art. 3º, b, figurando como princípio e como objetivo (art. 4), quando da imposição do desenvolvimento sustentável, que permeia todo o Acordo Ambiental (D’ISEP, 2017).
Considerações Finais
Sendo assim, podemos concluir que o AQMAM se tornou um instrumento de suma importância para estabelecer o compromisso de política ambiental dentro do Mercado Comum do Sul, situação na qual os Estados-membros do Mercosul partilham da responsabilidade de instrumentalizar e viabilizar a tutela do meio ambiente local. Além disso, o acordo em tela proporciona o exercício da cooperação entre os países em prol de um bem comum.
É inegável que os países membros do Mercosul demonstram certa preocupação sobre a temática ambiental, reconhecendo a necessidade de uma harmonização entre as leis que abordam tal temática, bem como seus obstáculos para isto. Entretanto, mesmo com a existência de algumas legislações que versam sobre o assunto, não é possível encontrar uma verdadeira política ambiental mercosulista, com um marco legal ambiental geral (OLIVEIRA e ESPÍNDOLA, 2015).
Portanto, os esforços por parte dos Estados-membros para alcançar essa harmonização legislativa devem continuar, pois são de suma importância dentro do processo de integração regional. Ademais, ao explanar sobre as legislações ambientais domésticas dos países membros, podemos perceber que há similaridades entre elas, como a forte influencia de conferências e tratados internacionais por exemplo. Tal aspecto é um ponto positivo para se alcançar o objetivo da harmonização ambiental dentro do bloco, uma vez que demonstra que os textos constitucionais partem de uma origem em comum (OLIVEIRA e ESPÍNDOLA, 2015).
Assenta destacar também que a desejada harmonização ambiental no Mercosul não se refere apenas a uma legislação una, mas também à cooperação dos Estados-membros em alcançar normas coerentes sobre essa temática.
Além disso, diante do quadro internacional atual, a necessidade de aliar desenvolvimento sustentável e crescimento econômico se faz de extrema necessidade. O mercado consumidor vem elevando seus níveis de preocupação com a degradação dos recursos ambientais, sendo necessário abandonar os meios de consumo antigos e se adequar às novas demandas globais. Por isso, se o Mercosul deseja em um futuro próximo discutir com outros blocos econômicos de forma igual, precisa buscar formas de adequar-se ao que o presente exige, ou seja, não pode se eximir da discussão ambiental e do desenvolvimento sustentável.
Referências Bibliográficas
ARGENTINA. Constituição (1994). Constituición Nacional Argentina. Buenos Aires, 1994.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
D’ISEP, Clarissa Ferreira Macedo. Mercosul e o meio ambiente: análise da tutela regional ambiental. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 14, n. 1, 2017 p. 283-293.
DE MORAES, Isaias Albertin, DE MORAES Flavia, MATTOS Beatriz Rodrigues Bessa. O Mercosul e a importância de uma legislação ambiental harmonizada. Revista de Direito Internacional, Brasília,, v. 9, n. 3, 2012, p. 91-101.
OLIVEIRA, Celso Malan, ESPÍNDOLA Isabela Battistello. Harmonização das normas jurídicas ambientais nos países do mercosul. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-753X2015000400002, Acesso em: 25 set. 2019.
¹ ARGENTINA. Constitución (1994). Articulo 41 “Todos los habitantes gozan del derecho a um ambiente sano, equilibrado, apto para el desarrollo humano y para que las atividades productivas satisfagan las necesidades presentes sin comprometer las de las generaciones futuras, y tienen el deber de preservarlo. El danho ambiental generara prioritariamente la obligacion de recomponer, segun lo establezca la ley.”