Quando se fala ou se escuta sobre globalização, mundialização ou internacionalização, alguns podem ver os termos como sinônimos, encontrar similaridades ou buscar as diferenças mais gerais ou específicas sobre estes. Para melhor compreender, em termos gerais: a globalização, que passou a ser mais falada a partir de 1960, considera a ideia de um mundo mais interligado, principalmente no que tange a fatores ligados à economia, cultura e informação, com o avanço tecnológico (HIRST THOMPSON, 1998; GIDDENS, 1991).
A mundialização pode ser vista pela maioria como sinônimo da globalização, mas para autores como René Dreifuss (1996) e Renato Ortiz (1994), esta estaria mais ligada aos processos que envolvem a cultura, os modos de viver e de pensar; enquanto que a internacionalização corresponde mais a ampliação das fronteiras, que podem ser provocadas pelo crescimento de trocas que ocorram por aspectos mais econômicos, incentivados por questões políticas e/ou culturais. Quando se fala em internacionalização, algumas pessoas podem pensar de imediato em empresas que buscam expandir seus mercados no exterior, mas não se limita a isso; ela pode e vem sendo utilizada também na atuação de entes públicos que buscam parcerias e a promoção de cooperações vantajosas para resolução de problemas, para o crescimento e desenvolvimento, como no caso de cidades.
A internacionalização e o turismo
A internacionalização de cidades pode ocorrer por meio da captação de recursos para o local ou entidade, da promoção do local por meio (ou com fins) econômico, cultural, turístico, por meio também da projeção internacional de outras formas benéficas; podendo ter como objetivo, por exemplo, que a captação de recursos possa ser relevante para projetos e atividades locais, com o propósito de promover o crescimento, desenvolvimento, melhoria de políticas locais, troca de experiências que contribuam para que a gestão seja capaz de inovar, solucionar problemas com visões distintas e dar maior visibilidade local, atraindo investimentos que venham ser estratégicos para a cidade.
Dentre os meios de internacionalização de cidades, como já citado anteriormente, está o turismo e compreender como este pode ser motivo ou fator contribuinte na internacionalização de cidades, nem sempre pode ser tarefa tão fácil. Isso ocorre porque o turismo é uma área que envolve muitos setores e que, dessa forma, nem sempre tudo é tangível ou medido da forma mais prática a compreender o funcionamento das atividades envolvidas. Quando se fala na área de “turismo, hospitalidade e lazer” é uma melhor opção a englobar empresas e pessoas que se inserem no contexto geral das atividades que formam o turismo.
Quando se pensa em turismo, muitas vezes é difícil para a maioria relacionar com relações internacionais, mas até mesmo na construção história do turismo podemos perceber aproximações com a história também está inserida e faz parte nas relações internacionais. Exemplo disso é a importância da Antiguidade Clássica do mundo greco-romano. De um lado, as viagens neste período foram incentivadas por peregrinações religiosas, o turismo de saúde e os jogos olímpicos (na Grécia); além da qualidade nas estradas (Império Romano), que permitia que as viagens acontecem (BARRETO, 1995, p 18).
O que marca esse período de maior segurança para viagens em todo o território romano é a Pax Romana, com quase dois séculos de paz, o idioma latim e grego e a moeda aceita por todos incentivando também o fluxo de negócios. Ainda sobre o período, com a queda do Império Romano (476 d.C.) os fatos que se sucederam acabam que por afetar o deslocamento das pessoas que “faziam o turismo” acontecer. E isso porque com o aumento da insegurança frente aos riscos de saques, assassinatos, destruição das estradas, ataques etc. a mobilidade ficou bastante afetada. Ocorre uma reformulação na sociedade, que retoma a vida mais ao campo, com a formação dos feudos, uma época muito marcada pelo trabalho no campo, o comércio sofre uma estagnação e consequentemente a história do turismo também sofre uma parada diante da ausência de necessidade de deslocamento dos feudos. Ou seja, quando as atividades que compõem o turismo superam as fronteiras nacionais, estas podem ser consideradas como um componente econômico e social, podendo ser analisado como um objeto das relações internacionais.
Esse pequeno recorte da história é para mostrar que, em muitos casos, a mesma história importante nas RI também é importante no turismo para compreender a dinâmica e a sua construção, podendo ser o turismo uma ferramenta para fomentar e fortalecer, inclusive, integração a nível nacional ou internacional. Com isso também, é possível perceber que as atividades que compõem o turismo são sensíveis a acontecimentos econômicos, políticos e sociais como um todo, podendo acentuar ou reduzir a quase zero a funcionalidade da área em apenas um local, numa região, país, continente ou até mesmo no mundo todo. Diante disso, qual seria a forma mais correta de abordar a expansão do turismo no mundo: globalização, mundialização ou internacionalização?
Digo que, depende da abordagem. A globalização do turismo consideraria a expansão das atividades e a existência destas pelo mundo como uma consequência do processo, incentivado principalmente por fatores econômicos, fortalecido por questões culturais ou políticas, impulsionada pelo avanço tecnológico voltado a informação. Com a diminuição das fronteiras e o auxílio da tecnologia, as pessoas conhecem o mundo antes mesmo de viajar, viajam até mesmo para locais que politicamente o acesso pode ser mais restrito, mas que as atividades turísticas existem no local.
Em sequência, quando se fala em mundialização do turismo (termo menos encontrado e usado), alguns podem considerar como um sinônimo do que acontece na globalização ou podem considerar questões mais culturais e de absorção de costumes. Atualmente, o termo internacionalização vem sendo mais empregado ao processo que ocorre com o turismo e isso porque, no mundo atual, com quase tudo interligado de alguma forma, quando fala-se em internacionalizar o turismo geralmente considera-se atividades que estão inseridas na área em determinado local (privado ou público), país ou região. Ou seja, para exemplificar a internacionalização do turismo é possível considerar atividades específicas (gastronomia, feiras, costumes, etc.), empresas ou instituições ligadas ao setor de turismo, hospitalidade e lazer, a internacionalização do turismo em cidades ou regiões.
A internacionalização do turismo em pequenas cidades
A internacionalização do turismo em uma cidade pode ser incentivada e promovida com a divulgação do destino no exterior (em eventos específicos ou locais mais estratégicos à cidade ou região), parcerias e acordos de cooperação a fim de atrair turistas de outros países ou de atrair investimento externo na cidade (neste caso, o turista teria a importância adquirindo e consumindo do local no próprio local, além da divulgação individual ou em grupos a qual este turista está inserido; enquanto que o investidor poderia incentivar negócios locais ou criar negócios próprios com a capacidade de propiciar a geração de emprego e renda, atraindo turistas nacionais e internacionais, auxiliando no aumento da competitividade do setor e da oferta local).
Também é possível promover a internacionalização do turismo por meio do setor privado, como já mencionado, através de incentivo para que as empresas locais inseridas nas atividades turísticas busquem promover o destino ou suas atividades no exterior, formulando parcerias com outras empresas e tendo a expansão dos negócios, além de contribuir com as atividades locais. E é por estes dois motivos citados acima que, em ambos os casos, há a necessidade de uma estrutura mínima para atender ao turista ou ao investidor externo.
A internacionalização do turismo, sendo mais fomentado pelo viés público ou privado, exige da cidade uma preparação para que a oferta possa ser atrativa e que a demanda não gere a acentuação desordenada de problemas locais diante da falta de um planejamento coordenado. É preciso, portanto, que a cidade esteja apta a oferecer políticas e serviços que possam garantir o recebimento, o retorno e/ou a permanência desse turista não nacional e/ou investidor externo.
Por este motivo há a enorme necessidade de uma atuação conjunta dos setores público e privado, principalmente em cidade menores, que comumente possuem demandas mais específicas e um grupo mais restrito de atores locais que realmente estejam aptos ou interessados em se engajar na promoção, crescimento e desenvolvimento local por meio da internacionalização do turismo. É comum encontrar nessas pequenas cidades, grupos privados que acabam tentando controlar o mercado turístico e a atuação do setor público pode proporcionar maior integração, contribuição e ganhos de todos ao processo. Sendo assim, a internacionalização do turismo em pequenas cidades não apenas pode ser fator econômico, mas pode promover um efeito de “teia” se bem planejado e exercido de forma a obter ganhos não apenas econômicos e para todos.
Quando se fala que a falta de preparação junto a demanda desordenada pode gerar aumento nos problemas locais é considerando que o turismo é uma área que abrange muitos setores e atividades e estas são compostas por entes públicos e privados, pessoas jurídicas e físicas, além de outros que são beneficiados ou que buscam obter algum ganho com as atividades e que a não identificação desses personagens que participam ou que são potenciais participantes nas atividades turísticas pode impedir o mapeamento de necessidades e impactos que possam ser ou que são causados e, consequentemente, o enfrentamento a estes.
Exemplos que podem ser mencionados estão relacionados a: questões de perca ou adaptação cultural local, para atender ao turista que vem de fora, muitas vezes com estereótipos ou ideias prontas do que vai encontrar no local e que nem sempre é algo verídico; o impacto nos recursos naturais, diante da falta de coordenação das atividades que possa promover a proteção ambiental de fato; o aumento de atividades ligadas à prostituição e exploração sexual (inclusive de menores), principalmente em regiões mais específicas, como as litorâneas ou onde a vulnerabilidade econômica e social é maior; a expansão de “negócios” voltados ao tráfico (o tráfico em geral, porque não se inclui apenas o de drogas, mas o de armas, o de pessoas, animais, etc.); o aumento na violência local, propiciando insegurança a residentes, visitantes e turistas, o que repercute de forma muito negativa no exterior, mas que vem sendo uma realidade em muitas cidades brasileiras, muitas vezes ocasionado por pessoas que veem esses turistas estrangeiros como “ouro” e querem extrair bens e pertences; entre outras questões, muitas vezes mais específicas de cada localidade.
O planejamento do turismo é um meio para que as desigualdades e problemas sejam reduzidos, gerando também maior segurança aos envolvidos nas atividades turísticas. A internacionalização por meio do turismo ou do turismo de uma determinada cidade é uma proposta que visa tentar se utilizar de potencialidades locais para promover o destino, sejam essas potencialidades naturais, culturais ou históricas, incentivadas por iniciativas da gestão pública, de entidades privadas ou até mesmo de pessoas locais.
Considerações Finais
Sem dúvidas, é preciso estudar muito mais a fundo as questões aqui abordadas de forma mais abrangente, este trabalho é uma gota de água em meio a um oceano que é a internacionalização, o turismo, as relações internacionais e a relação destes entre si e com todo o resto mencionado aqui. Existem situações mais complexas pertinentes a cada cidade ou região e que precisa ser analisada para que os envolvidos saibam os possíveis impactos que internacionalizar o turismo de pequenas cidades pode oferecer, considerando os benefícios e riscos. Seria como pensar o turismo sendo uma empresa ou indústria, empregadores e empregados, além dos fornecedores, e esta indústria contribuiria para o desenvolvimento econômico local, expandindo também o seu mercado e produto no exterior, gerando crescimento econômico com a oferta de emprego e de renda.
Referências bibliográficas:
BARRETTO, Margarita. Manual de iniciação ao estudo do Turismo. Campinas, SP. Papirus, 1995.
DREIFUSS, René Armand. A época das perplexidades: Mundialização, Globalização e Planetarização: novos desafios. Petrópolis: Vozes, 1996.
GIDDENS, Anthony. As Consequências da Modernidade. 2.ed. São Paulo: UNESP, 1991.
HIRST, Paul; THOMPSON, Grahame. Globalização em questão. Rio de Janeiro: Vozes, 1998
ORTIZ, Renato. Mundialização e cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994.
WAHAB, Salah-Eloin A. Introdução à administração do Turismo. São Paulo: Pioneira, 1991.
WATSON, Adam. A evolução da sociedade internacional: Uma análise histórica comparativa. Brasília: Universidade de Brasília, 2004.