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Uma análise comparativa entre os métodos qualitativo e quantitativo

Antes de providenciar uma comparação entre os métodos qualitativo e quantitativo, é fundamental delinear o fato de que as abordagens metodológicas qualitativas e quantitativas não devem ser vistas como categorias rígidas ou dicotomias inflexíveis. Essas duas tipificações de métodos representam, na verdade, um continuum. Desta forma, uma pesquisa apresentará uma tendência a ser mais qualitativa do que quantitativa ou vice-versa, ao invés de ser invariavelmente um ou outro. Essa concepção flexível permite que se entenda a pesquisa de metodologia mista como aquela que se encontra em um lugar intermediário nesse continuum, incorporando ao longo trabalho, na mesma intensidade, aspectos qualitativos e quantitativos.

Com essa ressalva estabelecida, pode-se partir para identificar a distinção entre cada um desses métodos. Essa distinção costuma ser apontada, em última instância, com a prevalência de palavras (em especial, adjetivos, que qualificam o objeto de pesquisa) ou de números (que, por sua vez, quantificam o objeto de pesquisa). Além desse ponto de partida, também existe a ênfase na distinção por meio das perguntas utilizadas: sendo as perguntas fechadas tipicamente condizentes com respostas quantitativas, enquanto as perguntas abertas tipicamente condizentes com respostas qualitativas. Se por um lado a pesquisa qualitativa explora o significado que indivíduos ou grupos atribuem a um determinado problema, por outro a pesquisa quantitativa dá preferência aos testes objetivos de teorias, partindo de hipóteses e examinando as relações entre variáveis a partir de dados empíricos.

Assim, conforme aponta Minayo (2008 apud. GUERRA, 2014), os métodos quantitativos visam a exibição de dados, indicadores e tendências que podem ser percebidas pela observação empírica, produzindo modelos teóricos que tenham uma aplicabilidade na prática de alto grau. É, em suma, uma abordagem causal. Guerra (2014, p. 10) salienta que “a pesquisa quantitativa sacrifica significados e simplifica a vida social [… d]aí a necessidade de novos paradigmas metodológicos que permit[a] a valorização destes aspectos”, sendo as abordagens qualitativas as que vão suprir essa lacuna deixada pela abordagem causal típica da pesquisa quantitativa.

O processo de pesquisa de uma abordagem qualitativa é dotado de uma espontaneidade, com uma análise dos dados transitando indutivamente de aspectos específicos para temas gerais e holísticos, engajando ativamente o pesquisador em interpretar o significado dos dados. Já o processo de pesquisa de uma abordagem quantitativa é dotado de uma maior rigidez, encaixando os dados obtidos dentro de procedimentos estatísticos e mensurando as variáveis através dos instrumentos que capturam os dados.

Abaixo, uma tabela comparativa sumariza os principais elementos de contraste entre as metodologias de pesquisa qualitativa e quantitativa:

MÉTODO QUANTITATIVOMÉTODO QUALITATIVO

Foco em númerosPerguntas fechadasCostuma ser replicávelDo geral para o particular (hipótese -> teste)Mensuração e testesPré-estruturado com maior rigidezVisa prever e estabelecer relações causaisGeneraliza características de uma populaçãoDados numéricos

Foco em palavras, em especial adjetivosPerguntas abertasTende a ser idiossincráticoDo particular para o geral (indução temática)Observação e interpretaçãoMaior liberdade e autonomia estruturalVisa descrever e explicar relaçõesÊnfase nas particularidades dos indivíduosDados textuais
Fonte: Elaborada pelo autor baseado em Guerra (2014).

Com os contrastes sumarizados na tabela acima, pode-se perceber que, conforme pontua Creswell (2013), os pressupostos filosóficos dos pesquisadores irão influenciar no caminho que trilharam, dando a preferência a uma abordagem ou outra conforme tais pressupostos se adequarem melhor. Além disso, os tipos de estratégias de pesquisa, desde experimentos quantitativos até estudos de caso qualitativos e os métodos específicos empregados na condução dessas estratégias também passarão a ser relevantes para entender de que forma uma pesquisa se encaixa em cada método e em cada um dos aspectos contrastantes desses métodos, sendo esta a razão pela qual é possível falar de uma metodologia mista, que engloba, em diferentes pontos, características dos métodos qualitativos e, em outros, características dos métodos quantitativos.

Aplicabilidade dos métodos qualitativo e quantitativo na pesquisa sobre Mercosul

Quanto à aplicabilidade, conforme indicam Hammarberg, Kirkman e Lacey (2016), os métodos quantitativos se destacam em situações onde dados factuais se mostram necessários para endereçar-se à pergunta de pesquisa, quando as variáveis são capazes de serem isoladas, além de situações onde o problema central de pesquisa é bem definido, sem ambiguidades relevantes. Já os métodos qualitativos, na visão de Hammarberg, Kirkman e Lacey (2016), devem ser usados na busca por responder perguntas relacionadas à experiência, significado e perspectiva, trazendo o ponto de vista das pessoas para o centro do problema de pesquisa.

Para a pesquisa intitulada provisoriamente “Investigação das perspectivas de integração regional na América Latina via Mercosul” será necessário fazer uso de uma abordagem mista que pode pender mais para o lado qualitativo, na medida em que os aspectos quantitativos serviram apenas de base factual para que seja possível se debruçar qualitativamente sobre os empecilhos e caminhos para integração regional por meio do Mercosul.

Na pesquisa, serão utilizadas três abordagens: uma investigação comparativa com a União Europeia; uma abordagem cultural, investigando a coerência e os paradoxos da noção de uma identidade latino-americana e como isso impacta no Mercosul; e, por fim, a investigação do próprio histórico do Mercosul, aplicando um recorte recente a fim de capturar os desafios mais atuais do bloco.

Na primeira abordagem, haverá uma preponderância de dados sobre a composição dos dois blocos (Mercosul e União Europeia) e uma investigação histórica sobre a trajetória de cada um, a fim de comparar e entender as razões que levaram cada um ao destino em que se encontram atualmente. Desta forma, essa abordagem pende para o método qualitativo, na medida em que interpreta, tece teses a respeito das diferenças, investiga particularidades sobre cada um dos blocos, tudo isso utilizando-se muito mais da linguagem e da caracterização do objeto de estudo do que da comparação estatística ou da exposição numérica dos argumentos.

Na segunda abordagem, haverá uma investigação cultural que se debruçará sobre a história da América Latina e fará uso de uma abordagem teórica conhecida como Teoria Mimética que é quase que exclusivamente qualitativa; essa seção, será, portanto, a que fará a abordagem mista pender para os aspectos qualitativos.

Na terceira e última abordagem, o método quantitativo se sobressai na medida em que uma investigação do histórico recente do Mercosul tem como anseio principal identificar as áreas nas quais o bloco se mostra mais frágil e menos bem-sucedido. Desta forma, a obtenção de dados numéricos e estatísticos sobre o desempenho recente do bloco, em especial com relação às suas pretensões econômicas, se mostrará útil para a essa empreitada.

Informações coletadas e processadas pelos métodos qualitativo e quantitativo

Em termos de informações que são tomadas em consideração por cada um desses métodos, a diversidade reflete as características que os colocam em contraste um com o outro. Sendo assim, é importante listar e explicar por que razão cada método dá preferência para um determinado tipo de informação. A tabela a seguir lista as principais informações que são coletadas e processadas por cada um dos dois métodos:

MÉTODO QUANTITATIVOMÉTODO QUALITATIVO

Dados numéricosQuestionáriosAmostragem amplaInstrumentos de obtenção de dadosTestes empíricosPesquisasÍndicesGráficos

EntrevistasEstudos de casoOpiniões de especialistasPontos de vistaNarrativasObservaçõesGrupos focaisEtnografia
Fonte: Elaborada pelo autor baseado em Guerra (2014).

De um lado, o método quantitativo privilegia tipos de informação que são mensuráveis e objetivamente processadas, sem ambiguidades e capazes de fornecer um direcionamento concreto para a resposta da pergunta direcionadora da pesquisa – isto é, desde que o método quantitativo tenha sido escolhido apropriadamente para ser o carro-chefe da pesquisa, não sendo este o caso na pesquisa aqui trabalhada. Portanto, informações como questionários que continham perguntas objetivas e numericamente mensuráveis, testes empíricos e informações obtidas por meio de instrumentos de obtenção de dados são alguns dos exemplos de como se pode caminhar por dentro desse terreno que constitui a abordagem quantitativa.

Já do outro lado é onde se encontram as informações que podem ser coletadas e processadas pela abordagem qualitativa, isto é, uma abordagem que vai de desencontro à objetividade fria e seca do método quantitativo, permitindo que as informações sejam permeadas de dubiedade, ambiguidade e camadas de significado, o que pode ser enriquecedor numa pesquisa adequada para este método, ou desastroso numa pesquisa que não se adeque com esse tipo de aprofundamento multifacetado e instável.

Entrevistas, opiniões de especialistas visando abarcar o pensamento acadêmico sobre determinado assunto, narrativas, observações e pontos de vistas são alguns dos elementos informativos que podem alimentar uma pesquisa qualitativa, todos esses com a sua particularidade e o seu efeito próprio dentro da pesquisa em que se farão presentes, o que evidencia, conforme as palavras de Jackson (2011, p. 157), “a capacidade do ser humano de refletir sobre sua própria situação” [tradução nossa], o que, na concepção do autor, muitas vezes serviu de base para separar as ciências sociais das ciências naturais, o que indica que o método qualitativo é costumeiramente mais adequado dentro das ciências humanas.

Limitações dos métodos qualitativo e quantitativo

Por fim, vale mencionar que ambos os métodos possuem limitações. O método quantitativo, com sua rigidez e pouco espaço para interpretação, torna o seu resultado muito bruto, com os números apenas mostrando uma parte reduzida da realidade, sendo um método reducionista por excelência. Isso implica que adotar uma metodologia quantitativa corresponde a se limitar intencionalmente no que quer estudado e avaliado. Já o método qualitativo é pouco preciso em comparação ao quantitativo, costumando deixar brechas para interpretações múltiplas e até mesmo interpretações que possam ser contraditórias entre si. Essa flexibilidade dos métodos qualitativos é, portanto, uma de suas fraquezas, já que implica em uma maior dificuldade em se precisar os resultados de uma pesquisa feita a partir de tal método.

Considerações Finais

Neste texto, buscou-se explicitar os aspectos contrastantes entre as metodologias quantitativas e qualitativas, salientando a existência nas pesquisas, em menor ou maior grau, de uma hibridez metodologicamente. Após tal constatação, deliberou-se sobre a aplicabilidade dos métodos analisados à pesquisa em desenvolvimento de título “Investigação das perspectivas de integração regional na América Latina via Mercosul”, identificando-se que tal pesquisa ostenta um direcionamento preferencial para as abordagens de cunho qualitativo, na medida em que a pesquisa tem uma forte dimensão histórico-cultural que se traduz como uma análise perspectival intensa, inadequada para a mera quantificação. No entanto, mais uma vez ressaltando o aspecto de hibridez de pesquisas, se detectou que a parte comparativa da pesquisa fará bastante uso de informações coletadas e processadas por meios quantitativos. Finalizou-se essa empreitada com o breve reconhecimento dos limites de tais métodos, notando tanto a flexibilidade dos métodos qualitativos quanto o caráter bruto dos dados obtidos quantitativamente como pontos de fraqueza presentes nestes métodos.

Referências

CRESWELL, John. Research Design: Qualitative, Quantitative, and Mixed Methods Approaches. 4. ed. Nebraska: Sage Publications, 2013.

GUERRA, Elaine Linhares de Assis. Manual de Pesquisa Qualitativa. Belo Horizonte: Grupo Ănima Educação, 2014.

HAMMARBERG ,K.; KIRKMAN, M.; LACEY, S. de. Qualitative research methods: when to use them and how to judge them. Human Reproduction, Oxford, v. 31, n. 3, p. 498–501, mar. 2016.

JACKSON, Patrick Thaddeus. The conduct of inquiry in international relations. Canada: Routledge, 2011.

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