Crime e Castigo é uma obra escrita e publicada na década de 1860. Antes de falar sobre ela, vale a pena falar um pouco sobre o autor. O escritor Fiódor Dostoyevski (1821-1881), quando jovem, foi inicialmente condenado à morte na Rússia por atitudes revolucionárias reprovadas pelo czar, mas acabou sentenciado a alguns anos de trabalhos forçados em uma parte remota do país. Cumprida a pena, o autor voltou a São Petersburgo, onde refez sua vida e onde ocorre a trama do livro.
O livro revolve ao redor de Rodia Raskolnikof, um jovem universitário russo que vive sozinho em São Petersburgo. O personagem central é alguém que vive em condições financeiras muito adversas, o que ajuda a torná-lo desesperançoso com o egoísta mundo que o rodeia. Apesar de sua pessimista visão de mundo, Rodia mantém seu idealismo vivo. E em meio a muitos conflitos internos, a violência acaba se tornando um recurso. Rodia é o centro de uma interessante trama policial, que perpassa por profundos elementos filosóficos, psicológicos e sociais da Rússia daquele momento.
Portanto, para quem gosta destes temas, é uma leitura cativante. A filosofia e a psicologia presentes na obra são razoavelmente objetivas. Nada de teorias e axiomas infindáveis. Rodia e outros personagens refletem bastante com seus botões sobre tais temas. Entretanto, em geral os temas são práticos porque são tratados em interações e diálogos entre pessoas na maior parte do tempo. Os diálogos são longos. Dostoyevski é muito detalhista na construção de ideias que os personagens expõem e debatem com as pessoas envolvidas.
Não é um livro sobre detalhes de paisagens e objetos, como são algumas obras mais antigas. Mas é sim um livro sobre detalhes expressados em interações entre pessoas. Portanto, é um livro para se ler com atenção porque cada palavra ou argumento conta, pelo menos assim parece ser a ideia do autor. A obra é dividida em 39 capítulos e um epílogo. Assim, pode ser lido em quarenta “doses”, sem que se perca a sua fluidez.
As ideias centrais da obra são, como diz o título, crime e castigo. Para quem gosta de investigação e Direito, o livro detalha nos mínimos detalhes os procedimentos vigentes da época, mais especificamente o caso de Rodia. Porém, o alcance do livro é muito mais amplo. Passa também, e bastante, por temas como os relacionamentos pessoais e pela busca de alguns indivíduos pela justiça social dentro de um contexto bastante capitalista, formal e repleto de convenções sociais da Rússia da época. A leitura flui bem e possibilita ao leitor uma visualização, ou pelo menos uma boa imaginação, da realidade de uma Rússia urbana, a partir da narrativa detalhada de Dostoyévski.
O livro pela perspectiva das relações internacionais:
Do ponto de vista da história como componente das relações internacionais, o que mais me cativou no livro foi a descrição do tecido social russo da época. Mais precisamente, o tecido social urbano de São Petersburgo. Uma cidade grande onde as coisas acontecem: negócios, casamentos, assassinatos, prostituição e festas. O estereótipo russo de um povo que se entrega à vodca é exposto, e as dinâmicas sociais que envolvem interesses, paixões e dinheiro também estão muito presentes, remetendo ao que ocorria de forma similar em outros grandes centros europeus da época.
A segunda metade do século XIX foi uma época de relativa paz no mundo, portanto, conflitos entre nações passam longe do cerne da obra; os conflitos que ocorrem são pessoais, dentro de um pequeno círculo social que se instala em São Petersburgo. Neste diminuto círculo, russos têm de lidar com russos, apesar de personagens secundários poloneses e alemães ganharem importância em algumas ocasiões.
O livro é antigo porque se situa em uma época de 160 anos atrás, porém, Dostoyevski traz, de forma lateral, elementos modernos à tona, tais como a discussão do tema da igualdade de gênero em uma Rússia patriarcal e machista. A mesma Rússia é entendida como um país extremamente fechado, entretanto, personagens sonham com outras possibilidades de mundos, desde a emigração à América, até o consumo de músicas francesas, chalés ingleses ou rum jamaicano. Prova de que a globalização já existia em São Petersburgo, apesar de ainda engatinhar. E falando em temas globais, surpreendentemente ou coincidentemente, o tema da atual crise que vivemos no ano de 2020 entra nas divagações de Rodia, em alguma parte do livro (sem spoilers).
Termino esta resenha recomendando a leitura. É uma obra clássica da literatura russa, e mundial, que merece ser lida para aqueles que não a conhecem. Dostoyevski consegue transportar o leitor para a Rússia daquele momento de forma muito adequada. E discute temas universais, tais como, crime, castigo, relacionamentos pessoais e dinheiro.
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