Os países do Brics lançaram uma parceria com o objetivo de eliminar as chamadas Doenças Socialmente Determinadas (DSDs), enfermidades cuja ocorrência e gravidade estão diretamente ligadas à pobreza e à desigualdade. A iniciativa busca fortalecer a cooperação entre as nações, mobilizar recursos e avançar esforços coletivos para eliminação integrada dessas doenças.
Quem explica é Gonzalo Vecina Neto, professor da Faculdade de Saúde Pública da USP e ex-presidente da Anvisa.
“É importante entender que existe um conjunto de doenças infectocontagiosas que incidem principalmente sobre populações pobres. Os determinantes sociais são o que fazem acontecer essa carga de doenças.” Entre as doenças priorizadas pela ação da parceria estão tuberculose, hanseníase, dengue e malária — todas com alta prevalência no Sul Global. O professor aponta que a tuberculose “está sempre presente na nossa população da periferia das grandes cidades e nos fundões da nossa sociedade”. A hanseníase, “infelizmente uma doença milenar”, também persiste em números elevados.
Ação intersetorial
Além do reforço aos sistemas de saúde, Vecina comenta o contexto estrutural que agrava essas doenças: “Como são doenças determinadas socialmente, têm pobreza e a estrutura pública de vida no meio do caminho. Saúde não resolve esse tipo de problema. Precisa de uma ação intersetorial, precisa de educação, de habitação, e de condições sociais melhores”. Nesse sentido, ele reforça a urgência de avançar na pesquisa científica para essas doenças, historicamente negligenciadas pela indústria farmacêutica dos países do Norte. “O Norte rico não quer saber de fazer pesquisa para nós. Então nós temos que fazer pesquisa para as nossas doenças e ter soluções melhores.”
Segundo o professor, é necessário desenvolver medicamentos mais eficazes e menos tóxicos. Os atuais tratamentos, sobretudo contra a tuberculose, têm efeitos colaterais profundos e são difíceis de ingerir: “São desastres, têm efeitos colaterais importantes, e por isso também os pacientes suspendem o tratamento”.
Brasil é exemplo no Brics
Além disso, Vecina explica que no cenário do Brics o Brasil desponta como exemplo de combate às DSDs graças ao SUS. “O Brasil é hoje o que tem a melhor condição de ataque a essas doenças. O SUS é muito diferente do que existe nos países do terceiro mundo e particularmente dos sócios do Brics”, avalia Vecina. Ele destaca a capilaridade da atenção primária no País, com cerca de 50 mil unidades atuando principalmente nas periferias, através da Estratégia de Saúde da Família.
A parceria assinada pelo Brics também aponta para a construção de uma agenda comum nos fóruns internacionais, ampliação de financiamento via bancos de desenvolvimento e uso de tecnologias como inteligência artificial, vigilância epidemiológica digital e plataformas interoperáveis. Para Vecina, no entanto, a resposta mais eficaz não virá apenas de laboratórios ou políticas setoriais. “O remédio mais importante de todos implica mais igualdade entre os seres humanos que vivem neste mundo.”
Texto do artigo Países do Brics se unem para eliminar doenças ligadas à pobreza e à desigualdade, de Gonzalo Vecina Neto, publicado por Jornal da USP sob a licença Creative Commons Attribution 3.0. Leia o original em: Jornal da USP.