A mudança do clima constitui o maior desafio que a humanidade enfrenta atualmente. As preocupações climáticas têm origem nos danos provocados ao meio ambiente pelo processo da industrialização e desenvolvimento econômico. A emissão desenfreada de gases de efeito estufa, nocivos à atmosfera, tem intensificado o fenômeno do efeito estufa e do aquecimento global. Assim, as ações humanas são as principais responsáveis pela ameaça de desestabilização do sistema climático, tendo efeitos prejudiciais para o bem-estar da humanidade. (FRANCHINI, RIBEIRO, VIOLA, 2012, p.10).
Alguns países são altamente vulneráveis à mudança do clima, o que faz com que alguns setores sofram grandes perdas frente aos impactos dessa mudança, como o caso dos setores agrícola e da zona costeira. Estes impactos afetam o crescimento econômico e, portanto, afetam diretamente o bem-estar da população. (ARAÚJO; DIAS, 2017, p.2). No âmbito das Relações Internacionais, a mudança do clima tem sido objeto de discussões multidisciplinares, uma vez que as consequências desse processo de mudança para o planeta não se restringe apenas às variáveis climáticas e ambientais, mas também inclui os âmbitos econômicos, políticos e sociais. (PIRES; RODRIGUES, 2010, p.400).
Dito isso, tratar sobre a questão climática significa tratar de um problema global que demanda ações urgentes para enfrentar a mudança do clima. Para isso, têm-se reuniões e conferências realizadas no âmbito da Organização das Nações Unidas. Assim, por quase três décadas, a ONU tem reunido quase todos os países do mundo para discutir as pautas climáticas. Este é um indicador de que a mudança do clima passou a ser uma prioridade para os países no Sistema Internacional.
A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima
Em 1992, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Rio-92 ou Cúpula da Terra, representantes de 179 países consolidaram a tentativa de intensificar as atenções para uma agenda global climática e ambiental. Assim, foi aprovada a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, em inglês, United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC).
A UNFCCC é um tratado internacional cujo objetivo é a estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera, de maneira a impedir uma interferência humana perigosa e permanente no sistema climático global. Tendo entrado em vigor no ano de 1994, a UNFCCC estabelece compromissos e obrigações para todos os países signatários, sendo esses países chamados de Partes da Convenção, no que diz respeito ao combate à mudança climática.
A UNFCCC tem como base o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, o que significa que, embora todas as Partes devam agir para proteger o meio ambiente e o sistema climático nas dimensões regionais, nacionais e global, é preciso considerar as diferentes circunstâncias de cada país. Em outras palavras, considera-se como cada Parte contribui para o problema, assim como a sua capacidade para prevenir, reduzir e controlar as ameaças voltadas à problemática da mudança do clima e seus impactos.
Tem-se ainda, no que diz respeito às evidências científicas acerca da mudança do clima, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Criado em 1988 no âmbito das Nações Unidas pela iniciativa do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e da Organização Meteorológica Mundial (OMM), o IPCC é uma organização político-científica que reúne cientistas de todo o mundo e indica uma tendência de aquecimento global em consequência das ações antrópicas. Esta indicação por parte do IPCC foi importante para que a UNFCCC estabelecesse como seu objetivo principal a estabilização das concentrações de gases de efeito estufa na atmosfera global.
A Conferência das Partes
A Conferência das Partes ou Conference of the Parties (COP) é o órgão supremo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima. Em outras palavras, a Conferência das Partes é uma associação de todos os países signatários da Convenção-Quadro que, desde a entrada em vigor da UNFCCC, passou a se reunir anualmente. Nestas reuniões são avaliados os progressos e as dificuldades das Partes em lidarem com a mudança do clima e seus impactos nos âmbitos econômico, ambiental e social.
Na Conferência das Partes, as deliberações são tomadas por consenso entre os países signatários da UNFCCC. Os únicos atores com poder de voto são os delegados governamentais dos países signatários da UNFCCC. No entanto, jornalistas e integrantes de organizações não governamentais participam das reuniões como membros observadores. Ao final de cada reunião da COP, uma série de decisões é adotada para conduzir as atividades das Partes durante o período que a sucede. Atualmente, as COPs são realizadas ao final de cada ano e são conhecidas pelo nome da cidade que a sedia.
Um breve olhar sobre algumas COPs e seus respectivos resultados
A partir da entrada em vigor da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, representantes de diferentes países se reúnem anualmente, no âmbito da Conferência das Partes (COP). A primeira Conferência das Partes (COP) ocorreu em 1995, na cidade de Berlim, Alemanha. Nesta oportunidade, o Mandato de Berlim foi firmado, estabelecendo um processo para negociar compromissos mais rígidos para países desenvolvidos, o que acabou por estabelecer as bases para a criação do Protocolo de Quioto.
A COP 3 foi realizada em Quioto, Japão, em 1997. Nesta conferência, um marco histórico no que diz respeito aos esforços para combater a mudança do clima foi alcançado, tendo as partes da UNFCCC aprovado o Protocolo de Quioto após intensas negociações. Este foi, portanto, o primeiro tratado internacional de redução das emissões de gases de efeito estufa. O Protocolo de Quioto definiu metas mais rígidas para os países industrializados no que dizia respeito à emissão de gases de efeito estufa, já que eles teriam a obrigação de reduzir a emissão destes gases em pelo menos 5,2% em relação aos níveis de 1990, no período de 2008 a 2012. O Protocolo entrou em vigor no ano de 2005, após a Federação Russa tê-lo ratificado.
Em 2009, líderes mundiais se reuniram para a COP 15 em Copenhague, Dinamarca. Nesta ocasião, o Acordo de Copenhague foi produzido. Este documento enfatiza a importância de se criar novos mecanismos de financiamento, assim como diretrizes para a transferência de tecnologias e a redução de emissões por desmatamento e degradação florestal. Em 2012, a COP 18 aconteceu em Doha, no Catar. Nesta oportunidade, os governos concordaram em trabalhar rapidamente em direção a um acordo universal sobre a mudança do clima até 2015 e encontrar maneiras de aumentar os esforços antes de 2020. Em 2014, a COP 20 aconteceu em Lima, Peru, onde os governos mundiais se reuniram para fazer um último esforço coletivo em direção a um novo acordo universal no âmbito climático no próximo ano, em 2015.
Assim, em 2015, a COP 21 aconteceu em Paris, França. Nesta conferência, o Acordo de Paris foi adotado por 195 nações com o propósito de fortalecer a resposta global às ameaças apresentadas pela mudança do clima. Pela primeira vez, um acordo climático uniu todas as nações por uma causa comum: a redução das emissões de gases de efeito estufa a partir do ano 2020, com o objetivo de impedir o aquecimento global de ultrapassar os 2ºC, ou 1,5ºC preferencialmente. Além disso, o Acordo de Paris buscou meios para reforçar a capacidade dos países de lidar e se adaptar aos impactos da mudança do clima causados pelo aquecimento global.
Aqui foram apresentadas apenas algumas das Conferências das Partes que ocorreram desde que elas foram estabelecidas. Ressalta-se que foram selecionadas as COPs que surtiram resultados relevantes no que diz respeito à ação dos países frente ao combate à mudança do clima. Até a atual data, foram realizadas 25 Conferências das Partes. A vigésima sexta COP está marcada para ser realizada em novembro de 2021 na cidade de Glasgow, Escócia.
A COP 26 e o porquê de ela ser tão decisiva
Tempestades, inundações, secas e incêndios florestais estão se intensificando. A poluição do ar afeta a saúde de dezenas de milhões de pessoas e a imprevisibilidade do clima causa danos irreparáveis às casas e aos meios de subsistência. As populações mais vulneráveis sofrem mais com os impactos da mudança do clima, o que evidencia ainda mais a desigualdade social no mundo. Assim, ações urgentes são necessárias para evitar um maior agravamento da crise climática.
A comunidade internacional deve unir forças para elaborar ações eficazes para evitar e minimizar as perdas e os danos que já ocorrem em consequência da mudança do clima. Medidas de mitigação e adaptação devem ser criadas, como financiamentos que possam melhorar os sistemas de alerta precoce, as defesas contra inundações, além de construir uma infraestrutura e agricultura resilientes para evitar mais perdas de vidas, meios de subsistência e habitats naturais.
A proteção e a restauração dos ecossistemas são fundamentais e uma maneira poderosa de aumentar a resiliência aos impactos da mudança do clima, pois estes ajudam a construir defesas naturais contra tempestades e enchentes. Além disso, ecossistemas saudáveis contribuem para o desenvolvimento da agricultura sustentável e ajudam a sustentar bilhões de pessoas em todo o mundo.
Neste contexto, em novembro de 2021, o Reino Unido sediará a 26ª Conferência das Partes, que reunirá as Partes da UNFCCC para acelerar a ação em direção aos objetivos do Acordo de Paris. As conferências das Nações Unidas sobre a mudança do clima estão entre as maiores reuniões internacionais do mundo. Assim, as negociações entre os governos são complexas e envolvem autoridades de todos os países do mundo, bem como representantes da sociedade civil, organizações não governamentais, e da mídia global.
A COP 26 não representa apenas mais uma tarefa no âmbito da mudança global do clima e também não é somente mais uma cúpula no âmbito internacional. A COP 26 apresenta uma particularidade – a urgência -, uma vez que este é o evento que muitos cientistas, pesquisadores, ativistas e cidadãos acreditam ser a última e melhor chance do mundo de tentar controlar a mudança do clima.
Para entender o porquê dessa urgência, faz-se necessário olhar para trás. Em 2015, a COP 21 ocorreu em Paris, onde, pela primeira vez, todos os países concordaram em trabalhar juntos para conter o aumento da temperatura média do planeta a menos de 2ºC, ou preferencialmente 1,5°C. Assim, foi acordado o Acordo de Paris. Sob o Acordo de Paris, os países se comprometeram a apresentar planos nacionais estabelecendo o quanto eles reduziriam de suas emissões (Contribuições Nacionalmente Determinadas, ou simplesmente NDCs). Os países concordaram que a cada cinco anos eles voltariam com um plano atualizado que refletisse sua maior ambição possível naquele momento.
A data para a atualização desses planos seria o ano de 2020, no entanto, a COP foi atrasada devido à pandemia do coronavírus. Logo, será exatamente na COP 26, a ser realizada em Glasgow, no final deste ano, que os países atualizarão os seus planos de redução de emissões. Neste sentido, tem-se que, embora significativos, os compromissos assumidos em Paris não são suficientemente ambiciosos. Por mais importante que a COP de Paris tenha sido, tendo alcançado um acordo climático histórico, a década até o ano 2030 será crucial para a ação climática, na qual os países deverão ir muito além em suas ambições e objetivos do que o que foi acordado em Paris.
Ainda, é importante ressaltar a importância de limitar o aumento da temperatura a 2ºC ou, preferencialmente, 1,5ºC. Ao limitar o aumento da temperatura média da Terra em 2ºC, haveria amplos e severos impactos sobre as pessoas e o meio ambiente. No que diz respeito à sociedade, grande parte da população mundial seria exposta ao calor extremo, levando a problemas de saúde e a mortes relacionadas ao calor. No que diz respeito ao meio ambiente, os recifes de corais seriam destruídos quase em sua totalidade. O gelo do mar Ártico derreteria inteiramente, com impactos avassaladores na vida selvagem e nas comunidades que eles sustentam.
Por sua vez, ao limitar o aumento da temperatura média da Terra em 1,5ºC, os impactos seriam graves, mas consideravelmente menos severos. Haveria menores riscos de escassez de alimentos e água e menos espécies em risco de extinção. Menores também seriam as ameaças à saúde humana decorrentes da poluição do ar, como doenças respiratórias. A desnutrição e exposição ao calor extremo também seriam menores. Dito isso, é por todos esses fatores que cada fração de grau de aquecimento é importante. É por isso também que os países devem dedicar-se a manter viva a perspectiva de limitar o aumento da temperatura em 1,5ºC.
Considerações finais
Pode-se concluir, portanto, que a COP 26 é a última grande oportunidade para que o mundo adote medidas urgentes e imediatas para colocar um fim definitivo na era dos combustíveis fósseis e começar a regenerar a natureza. Essas ações garantirão que os ecossistemas do planeta permanecerão intactos. Cada dia que se passa sem uma ação urgente representa que os governos estão fracassando com suas futuras gerações. A crise climática afeta a todos, embora com intensidades diferentes. Assim, a crise climática evidencia a desigualdade.
Os olhos do mundo estarão em Glasgow, em novembro de 2021, observando cada discurso, cada passo e cada movimento executado pelos países frente aos desafios da mudança do clima. A COP 26, portanto, pode trazer a esperança de um futuro melhor, mais sustentável e justo, com menos desigualdade e maior responsabilidade com o meio ambiente. Mas para isso, os líderes têm que se comprometer e cumprir. A COP 26 é, de fato, uma oportunidade para que os países transformem seus compromissos em ações concretas. Somente através de ações concretas a situação poderá ser minimamente revertida, sendo o ano de 2030 decisivo no que diz respeito à ação climática. A partir desta data, os impactos da mudança do clima serão catastróficos.
Referências bibliográficas:
ARAÚJO, Talita Jéssica do Nascimento; DIAS, José Diego de Sousa. Mudanças climáticas e impactos econômicos: avaliações para o Brasil. 2017.
FRANCHINI, Matías; RIBEIRO, Thaís Lemos; VIOLA, Eduardo. Climate governance in an international system under conservative hegemony: the role of major powers. Revista Brasileira de Política Internacional, Brasília, v. 55. 2012.
PIRES, Mônica Sodré; RODRIGUES, Diego Freitas. Regime Internacional de Mudanças Climáticas: estagnação ou aprendizado? Revista Política Hoje, Pernambuco, v. 19, n° 2, p.398-436, 2010.