Para compreender os impactos que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) -, causou após sua fundação no dia 14 de setembro de 1960, precisamos esmiuçar alguns fatos importantes que precederam e corroboraram com sua criação.
A carência de fontes energéticas acompanha a evolução da civilização humana ao longo dos séculos, e com a descoberta do petróleo, muitos avanços tecnológicos surgiram a partir da Segunda Fase da Revolução Industrial (1850). Jacques Bergier, autor do livro a Guerra Secreta do Petróleo, descreve essa fonte energética como sendo “o sangue da civilização”, pois para o autor, sem o petróleo e seus derivados, não haveria os meios de transportes bélicos que conhecemos, como os blindados e aviões, inviabilizando a defesa nacional de um país.
De forma similar, João Paulo Pulido e Pedro Miguel Fonseca, explicam que “a produção de energia está associada à própria existência do Ser Humano” podendo essa ser a baliza para estabelecer a hierarquia das civilizações segundo o seu consumo e produção energética. Após essas considerações iniciais sobre a importância do petróleo para a soberania de um país, vamos analisar a sua evolução do uso do petróleo a partir do século XX, até a década de 1960, que é o ponto do nosso marco histórico.
Após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), o petróleo tornou-se fundamental para os assuntos internacionais, pois o uso dele na Guerra, revolucionou o modelo estratégico e bélico dos conflitos, permitindo uma mobilidade, terrestre, marítima e área das forças armadas, impensáveis (PULIDO, 2004), isso fez ampliar os interesses de países como Inglaterra, Estados Unidos, França, Alemanha, dentre outras potências da época, para a importância do petróleo como sendo um elemento relevante para a sua soberania geopolítica.
Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os Estados Unidos produziam em média 63% do petróleo mundial, entretanto, as autoridades governamentais perceberam que havia grandes reservas de petróleo no Oriente Médio, sendo necessário sua participação nesse mercado, não apenas para a condução da Guerra, mas para a segurança nacional dos EUA (FUSER, 2008).
Essa análise geopolítica sobre a importância do petróleo por parte das forças governamentais estadunidenses, levaram suas atenções às relações políticas da Grã-Bretanha no Oriente Médio para que as reservas petrolíferas não caíssem sob o controle do Eixo (grupo composto pelos alemães, italianos e japoneses). Com o fim da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos já haviam instalado bases militares no território do Golfo Pérsico, garantindo lucros econômicos na região.
Dessa forma, até o início da década de 1960, quem dominava, controlava e ditava as regras do mercado petrolífero do “poço ao posto”, eram as empresas conhecidas como sendo as Sete Irmãs, ou seja, era a Stardard Oil of New-Jersey, Royal Dutch Shell, Gulf, Texaco, Socony Mobil, Standard of California e British Petroleum. Elas juntas controlavam cerca de 90% das reservas de petróleo, através do estabelecimento de contratos de concessão com os países que dispunham de reservas (PINTO JR, 1998), sendo essa a matéria prima mais consumida após a Segunda Guerra Mundial, por isso um grande interesse das multinacionais do bloco capitalista em controlar esse segmento.
Nas reflexões de Pedro Barros e Luiz Pinto, as multinacionais, conhecidas como sendo as Sete Irmãs – Majors, utilizaram-se de acordos “interfirmas e articulações com os Estados de origem para terem o acesso às reservas de petróleo de forma mais barata, saindo do eixo estadunidense que tinha gastos mais elevados e uma produção elevada de petróleo ocioso. Para João Pulido e Pedro Fonseca, as Majors controlavam “a exploração, o fornecimento, o transporte, a refinação e a comercialização do petróleo a nível mundial”.
Estabelecendo desse modo um monopólio sobre a comercialização da fonte de energia, abarcando países que passavam a se tornar dependentes do petróleo ou iniciavam a utilização dele. Esse sistema de controle exploratório e de interferência no preço final da venda dos barris do petróleo no mercado mundial, favoreceu aos países ricos – de reserva petrolífera – criar uma organização forte para inibir essas ações estrangeiras.
A Criação da OPEP em 1960
Durante a década de 1950, em meio ao período da Guerra Fria, a União Soviética ampliou sua produção no mercado petrolífero em face à política estadunidense, que na ânsia de proteger a renda de seus produtores, impuseram, a partir de 1959, cotas para o petróleo importado (BARROS, 2010). Essa manobra dos Estados Unidos causou uma queda nos preços do barril do petróleo que desagradou aos países exportadores do petróleo. Esse foi um dos motivos que fomentou a criação da Organização dos Países Exportadores de Petróleo – OPEP -, no dia 14 de setembro de 1960.
Sobre os motivos e/ou objetivos da criação da OPEP, João Pulido e Pedro Fonseca, descrevem que a Organização objetivava “controlar os preços do petróleo nos mercados mundiais”, após sucessivas quedas nos preços do barril do petróleo oriundo da intromissão da presença das Sete Irmãs, os países da Arábia Saudita, Kuwait, Iraque, Irã e Venezuela, se reuniram no dia 10 de setembro de 1960, a fim de criar uma organização que tivesse como finalidade unificar as políticas petrolíferas dos Estados Membros para salvaguardar seus interesses frente aos interesses estrangeiro.
Assim, no dia 14 do mês corrente, os Estados Membros assinaram na Conferência em Bagdá, um acordo que previa o estabelecimento; “i) de uma comissão consultiva de petróleo; ii) de políticas coordenadas para defender a estrutura de preços; iii) de auxílio mútuo na criação de companhias estatais em todos os países-membros” (BARROS, 2010). Sendo assim, para que a OPEP tivesse o controle da produção dos barris do petróleo, eles precisariam comandá-las, sem a intervenção das Sete Irmãs.
Um ano após a criação da OPEP, novos países produtores de petróleo demonstraram interesse em fazer parte da Organização, como foi o caso do Qatar em 1961, Indonésia e Líbia em 1962, Abu Dhabi em 1967 (Emirados Árabes Unidos em 1974), Argélia em 1969, Nigéria em 1971, Equador em 1973 e Gabão em 1975. Os Países Membros promoveram uma nova conferência, sendo dessa vez em Caracas entre os dias 15 e 21 de janeiro de 1961, para escolher o país que seria a sede da Organização.
Inicialmente sendo essa a cidade de Genebra, na Suíça, mas no decorrer de quatro anos, os membros da OPEP transferiram-se para a cidade de Viena, alegando que o Governo suíço não havia concedido a eles privilégios de imunidade. Para Thompson Motta, a postura adotada pelo Governo suíço derivou-se da suspeita de que as intenções da OPEP eram de defender os interesses particulares e interesses únicos de seus países membros e que não tinha nenhum interesse internacional. A transferência para Viena ocorreu no dia 24 de junho de 1965, com as garantias que os suíços negaram.
No dia 6 de novembro de 1962, sob o Número 6.363, as Nações Unidas por meio do Artigo 102, reconheceram que a OPEP era uma organização intergovernamental permanente com status internacional (MOTTA, 2005), não podendo estar envolvida diretamente com transações comerciais, por não se tratar de uma entidade comercial. Após a criação e a inclusão de novos membros, a OPEP não conseguiu alcançar os objetivos de controlar a venda do barril do petróleo em seus Estados.
A realidade foi que ao longo da década de 1960, os Países Membros possuíam rivalidades e disputas políticas internas que as impediam de unir suas agendas políticas e econômicas, seguindo como a presença das grandes companhias no controle absoluto desde a extração, a venda do óleo cru em seu território. Paralelamente a isso, os países membros possuíam a responsabilidade de controlar a própria demanda interna, fato que dificultava o alinhamento da organização juntamente aos conflitos ideológicos.
Denota-se que a competição existente no mercado petrolífero entre as Sete Irmãs e a OPEP impulsionou os estudos sobre a Teoria dos Jogos, área da economia. A disputa entre ambos, estava dentro do conceito da Guerra Fria a partir do âmbito comercial, promovendo avanços antes da eclosão da crise de petróleo em 1973. A utilização de variáveis, como a demanda interna e oposição à ideologia ocidental ou oriental, nos estudos quantitativos fomentou novas análises sobre o petróleo que buscavam prever crises ou estabelecer padrões das flutuações dos preços.
Considerações finais
A partir de 1971, fatores externos contribuíram para que a OPEP conseguissem ter o controle da política do petróleo, por meio da desvalorização do dólar ocorrida em agosto de 1971, após a suspensão da conversibilidade ouro-dólar, tendo como efeito imediato, a queda do poder de compra dos países-membros da OPEP (TOSCANO, 2004). Fuser descreve as ofensivas dos países que compunham a OPEP sendo como uma;
Sequência de eventos que culminou no “choque do petróleo” que teve início no dia 8 de outubro, no terceiro dia da guerra de Yom Kippur, deflagrada com o ataque de surpresa de tropas do Egito e da Síria às posições de Israel no Sinai e nas Colinas de Golã. (…) os delegados da Opep, ao se reunirem novamente, no dia 16, na cidade do Kuait, decretaram por sua própria conta o aumento que reivindicavam, elevando o preço do petróleo de US$ 3,01 para US$ 5,12 por barril. [FUSER, 2008].
Os conflitos políticos entre os países árabes com Israel, trouxeram como consequência um embargo do petróleo a todos os países que apoiavam o Estado de Israel, aplicando inicialmente apenas aos Estados Unidos, os boicotes foram depois estendidos para Holanda, Portugal, Rodésia (atual Zimbábue) e África do Sul (FUSER, 2008). Após o ano de 1973, o mundo que comprava o barril do petróleo por US$3,01 passou a pagar em outubro do mesmo ano US$ 5,12, e em 1974, o preço novamente teve alta, alcançando as cifras de US$12,50 por barril.
Em menos de um ano, o valor foi triplicado, ocasionando impactos econômicos aos países que passaram a ser dependentes dessa fonte energética, para obter um desenvolvimento acelerado após a II GM. A crise também trouxe como uma de suas consequências a consolidação da OPEP no mercado mundial, influenciando e condicionando países a preços determinados. Assim como, a emergência da globalização e a necessidade de relações entre países e a organização agora detentora das maiores reservas de petróleo do globo.
Referências Bibliográficas
BARROS, Pedro Silva; PINTO, Luiz Fernando. O Brasil do Pré-Sal e a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP). 4°. ed. [S. l.]: Ipea: Boletim de Economia e Política Internacional, 2010.
BERGIER, Jacques; THOMAS, Bernard. A guerra secreta do petróleo. São Paulo: Livraria Editora LTDA, 1976.
FUSER, Igor. Petróleo e poder: envolvimento militar dos Estados Unidos no Golfo Pérsico. São Paulo: Unesp, 2008.
MOTTA, M.F Thompson. A Origem da OPEP. Revista Conjuntura Econômica, [S. l.], p. 34-36, 18 ago. 2005.
PULIDO, João Paulo N.G; FONSECA, Pedro Miguel. O Petróleo e Portugal: o mundo do petróleo e o seu impacto no nosso país. Lisboa: Tribuna da História, 2004.
TOSCANO, Daniella. A influência do sistema Petrobras sobre a ação externa do Governo Geisel (1974-1979). Orientador: José Flávio Sombra Saraiva. 2004. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) – Universidade de Brasília, Brasília, 2004.