O período entreguerras
O período entreguerras foi marcado pelo ressentimento do Império Alemão em relação às imposições estabelecidas pelo Tratado de Versalhes, que incluíam a responsabilização pela Primeira Guerra Mundial, perda territorial, restrições ao exército alemão e o reconhecimento da independência austríaca. Além disso, outro marco deste período foi a Grande Depressão, um período de grave crise econômica mundial que acabou fortalecendo a ascensão de regimes autoritários. Na Itália, por exemplo, o Partido Fascista de Benito Mussolini, no poder desde 1921, acabou se fortalecendo ainda mais. E na Alemanha possibilitou a chegada de Adolf Hitler à liderança do Partido Nazista, em 1933, graças às promessas que prometiam melhorar a conjuntura econômica alemã.
Entretanto, o que parecia à princípio apenas uma ameaça regional, logo viria a impactar, não apenas o cenário europeu, mas o cenário internacional também. O Partido Nazista determinou imediatamente a anulação do Tratado de Versalhes e estabeleceu políticas nas quais todas as ações de Hitler foram baseadas: O antissemitismo; a ideia da raça ariana justificada pelo conceito da eugenia; e o expansionismo alemão, na garantia de conquistas territoriais que pudessem suprir as necessidades da Alemanha, o chamado Lebensraum de Ratzel. Outra preocupação para o cenário internacional se dava no Leste Asiático, considerando também o expansionismo do Império do Japão e a invasão da Manchúria.
A eclosão da Segunda Guerra Mundial
A partir de 1938, a Alemanha Nazista tornou-se mais agressiva e passou a reivindicar o território da Checoslováquia, concedida após o Acordo de Munique. Entretanto, Hitler tinha ambições ainda maiores. Em agosto de 1939, os nazistas propuseram à URSS um acordo que consistia na divisão do Leste Europeu e a promessa de não-agressão entre ambas as potências que culminou no Pacto Moltov-Ribbentrop. Poucos meses depois após a ratificação do pacto, o exército nazista invadiu a parte ocidental da Polônia e, logo em seguida, a URSS invadiu a parte oriental do território polonês, sem grandes problemas as duas potências concordaram na divisão da Polônia com base no que havia sido estabelecido anteriormente no pacto assinado em agosto. Destaca-se que o grande interesse nazista estava ligado à retomada do corredor polaco, território estratégico e disputado desde 1919.
Consequentemente, após a invasão da Polônia, potências como França e Reino Unido declaram guerra à Alemanha Nazista. Inicialmente, outras potências relevantes como Estados Unidos e URSS mantiveram-se neutras em relação ao conflito. Paralelamente, Itália e Japão declararam apoio a Hitler, formando assim as potências do Eixo. Os rumos da guerra foram modificados apenas em 1941, com o ataque do Japão à base estadunidense de Pearl Harbor e da Operação Barbarossa, a qual rompeu o pacto de não-agressão entre a Alemanha Nazista e os soviéticos.
A Primeira Conferência de Moscou – 1941
Os ataques supracitados fizeram com que Estados Unidos e URSS abandonassem a neutralidade e aderissem à guerra ao lado dos Aliados. Além disso, a resistência soviética às tentativas de invasão durante a Operação Barbarossa chamaram a atenção do primeiro-ministro britânico, Winston S. Churchill, e do presidente estadunidense, Franklin D. Roosevelt. Consequentemente, Churchill e Roosevelt propuseram ao líder soviético, Josef Stálin, que fossem realizados encontros para debater o futuro do conflito. Sendo assim, de acordo com Stahel (2011) foi realizada a Primeira Conferência de Moscou, em 1941.
Cassidy (2010) ressalta que esta conferência, composta por delegações representando as três potências, foi distinta do conceito de disputa apresentado em conferências históricas anteriores. Tanto o Reino Unido quanto os EUA sabiam que o clima deveria ser de cooperação à URSS e no combate ao inimigo comum. Desta maneira, foi estabelecido o Primeiro Protocolo, uma espécie de acordo de assistência sistemática ao Exército Vermelho na luta contra a Alemanha Nazista. Todavia, o que a URSS “realmente queria, mais do que suprimentos para o Exército Vermelho, era um exército aliado bem equipado, lutando em campo, cortando a pressão alemã em sua fonte” (CASSIDY, 2010, p. 138).
Apesar disso, a conferência de 1941 foi relevante pelo fato de que pela primeira vez as três potências discutiram possíveis objetivos comuns para o pós-guerra, discussões estas levantadas pela URSS. Entretanto, nada ficou decidido em relação à isso. De acordo com Cassidy (2010), somente após a conferência este debate foi retomado entre a URSS e o Reino Unido, no entanto, a situação estremeceu brevemente a relação entre as potências. Considerando que Stálin desconfiou da demora de Churchill em estabelecer pontos relevantes e no esclarecimento de quais seriam as ações e os ideais britânicos rumo à paz. Posteriormente, ambos entraram em concordância sobre “a necessidade de derrota total da Alemanha e de medidas que tornassem impossível qualquer repetição das agressões alemãs no futuro” (CASSIDY, 2010, p. 139).
A Segunda Conferência de Moscou – 1942
Em 1942, as três potências se reuniram novamente no intuito de ampliar os debates sobre a guerra e como deter as empreitadas alemãs. Gilbert (1986) destaca que esta conferência serviu para discutir o aumento do apoio estadunidense e britânico ao Exército Vermelho. Além disso, foram tratadas as questões que envolviam a invasão alemã ao continente africano, o que culminou com a Operação Tocha, no objetivo de enfraquecer e dissipar as forças alemãs e no intuito de diminuir a pressão sobre o Exército Vermelho. Esta operação marcou a maior ação anglo-americana durante a Segunda Guerra Mundial.
Outra questão amplamente conversada, segundo Gilbert (1986), foi a necessidade de defesa da região Cáucaso e de impedir a movimentação alemã em direção às reservas petrolíferas de Baku. Vale ressaltar que durante a Operação Barbarossa estes eram os objetivos de conquista para Hitler. Fora isso, a ofensiva alemã pretendia apoderar-se das reservas, numa espécie de continuidade à Operação Barbarossa e na tentativa de abrir uma frente que pudesse garantir o acesso nazista à Stalingrado, em um possível novo ataque às forças soviéticas. Apesar do rápido avanço alemão, a URSS conseguiu reagir através da Batalha de Stalingrado, forçando a rendição da Alemanha. Vale ressaltar que Stalingrado representava a simbologia e o poder soviético já que a cidade era uma homenagem ao líder Josef Stálin.
A Terceira Conferência e as Declarações de Moscou – 1943
Em 30 de outubro de 1943, foi realizada a Terceira Conferência de Moscou, na qual foram estabelecidos avanços que já haviam sido debatidos nas conferências de Moscou anteriores. Desta vez, EUA e URSS concordaram na ideia de que era preciso a criação de uma organização internacional capaz de substituir a Liga das Nações e que fosse eficaz na prática e no objetivo de manter a paz. Tal ideia culminou com a Declaração das Quatro Nações ou a Declaração das Nações Unidas ratificada pelos EUA, pelo Reino Unido, pela URSS e pela China. Garver (1988) afirma que a conclusão da Declaração mencionada não ocorreu tão facilmente, considerando que a URSS não queria reconhecer a China como potência.
Além do mais, o autor ressalta que Churchill vislumbrava que o acordo deveria garantir forças de manutenção da paz permanentes, o que não ocorreu. Garver (1988) aponta ainda a desconfiança de Roosevelt em relação à postura soviética, o presidente estadunidense acreditava que Stálin talvez não quisesse se contrapor ao pacto de não-agressão que havia entre a URSS e o Japão desde 1941. Outro acordo de extrema relevância definido durante a conferência de 1943, foi a Declaração Sobre Atrocidades, a qual definiu que os homens e oficiais da Alemanha Nazista que foram coniventes ou cometeram crimes e atrocidades durante a Segunda Guerra Mundial seriam julgados e punidos no país em que as barbáries ocorreram. É destacável que a Declaração Sobre Atrocidades foi o princípio do que posteriormente possibilitaria o Tribunal de Nuremberg.
Ainda sobre o desenrolar da guerra, foram estabelecidas mais duas declarações referentes à Áustria e à Itália. Maciel (2017) salienta que apenas a Declaração das Nações foi assinada pela China, as demais foram idealizadas e assinadas pelos EUA, Reino Unido e pela URSS. A Declaração Sobre a Itália “abordou a concordância política das nações em relação ao novo governo da Itália e a destruição do fascismo para implementação dos princípios democráticos” (MACIEL, 2017, p. 17). Já a Declaração Sobre a Áustria definiu que o país deveria ser considerado vítima das ações de Hitler e, portanto, libertada da dominação alemã.
As consequências, o legado sombrio e as controvérsias das declarações de Moscou
Algumas controvérsias cercam a Declaração Sobre Atrocidades pelo fato de que atrocidades não teriam sido cometidas apenas pelos países do Eixo, além das conhecidas torturas praticadas pelos Aliados, ao menos outros dois crimes de guerra são lembrados até hoje. O primeiro é o estupro em massa de mulheres alemãs por parte de soldados estadunidenses e, principalmente, soviéticos. Remme (2011) afirma que existem documentos secretos do Exército Vermelho que comprovam o que seria o maior estupro em massa da história da humanidade. Já Nogueira (2020) salienta que as violações sexuais não foram exclusividade dos soviéticos, considerando que a China teria usado a mesma prática ao retomar a Manchúria dos japoneses. O segundo crime de guerra cometido pelos Aliados foram os ataques a alvos civis, sendo o maior deles o bombardeio atômico proferido pelos EUA às cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, em agosto de 1945, no qual morreram cerca de 200.000 pessoas.
A primeira consequência direta da Segunda Guerra Mundial foi o crescimento e a expansão da URSS, inúmeros historiadores afirmam que caso os Estados Unidos tivesse atuado desde o início da guerra, os soviéticos não teriam se fortalecido tanto e, talvez, nem houvesse a disputa bipolar de poder entre as duas potências que marcaram a Guerra Fria. Quanto ao legado sombrio da Segunda Guerra Mundial, é possível observar que apesar das declarações definidas em Moscou e da tentativa de clarificar a toxicidade do regime nazista e dos ideais antissemitas, a história parece se repetir hodiernamente. Afinal, não são raros os casos de manifestações de grupos e até mesmo partidos políticos com tendências neonazistas presentes não apenas na Europa. Exemplos do renascimento dos ideais nazistas podem ser encontrados na Alemanha, na Áustria, nos EUA, na Ucrânia, mas também em países que possuem uma maior miscigenação como o caso do Brasil.
Referências
CASSIDY, H. Moscou Dateline 1941-1943. Publicação Kessinger, 2010.
GARVER, J. Relações Sino-soviéticas 1937-45: A diplomacia do Nacionalismo Chinês. Oxford University Press, 1988.
GILBERT, M. Caminho para a vitória: Winston S. Churchill 1941-45, Londres, Hermann/Minerva, 1986.
MACIEL, S. H. Um histórico da justiça penal internacional: os princípios de Nuremberg e sua aplicação contemporânea nos tribunais penais internacionais, Universidade Federal do Paraná, 2017.
NOGUEIRA, A. Entre massacres e ataques: os crimes cometidos pelos Aliados na Segunda Guerra Mundial. Aventuras na História, 2020. Disponível em: https://www.google.com/amp/s/aventurasnahistoria.uol.com.br/amp/noticias/reportagem/estupros-massacred-e-ataques-os-atrozes-crimes-de-guerra-cometidos-pelos-aliados.phtml. Acesso em: 30 ago. 2021.
REMME, T. The Battle for Berlin in World War Two, BBC, 2011. Disponível em: http://www.bbc.co.uk/history/worldwars/wwtwo/berlin_01.shtml. Acesso em: 30 ago. 2021.
STAHEL, D. Kiev, 1941: A batalha de Hitler pela Supremacia no Oriente. Cambridge University Press, 2011.